“Pós-modernismo” é um conceito relativamente enganoso. Por um lado, identifica algo real: ideologias que rejeitam completamente a ideia de uma realidade objetiva e, consequentemente, as ideias de verdade, moralidade, razão, etc. Por outro, o conceito diferencia ideologias que não são essencialmente diferentes.
Um “pensador pós-moderno” é aquele que leva as ideias de Kant ou Hume às suas últimas consequências – como Foucault ou Derrida – e rejeita completamente a possibilidade da obtenção de conhecimento. A questão essencial no contexto da filosofia, porém, não é levar ou não as ideias de Kant ao extremo, mas considerar suas ideias válidas em qualquer medida – em especial, sua separação, comum a Hume, entre a “realidade tal como é” e a “realidade tal como é percebida”.
Tomemos Jurgen Habermas, como exemplo. Ele é considerado um crítico do pós-modernismo, pois seu pensamento pragmatista[1] e materialista não inclui uma rejeição explícita e contundente às ideias de verdade e objetividade. Todavia, ele ainda se baseia na dicotomia kantiana, e redefine o conceito de “verdade” como um “consenso racional entre diversos indivíduos” – o que ignora a natureza da verdade como algo independente da opinião de um coletivo.
O mesmo é válido para neopositivistas como Karl Popper e Thomas Kuhn (dos quais tratamos nesse artigo) e sua ideia de “verdade” como uma crença com base na qual o indivíduo pode agir de forma mais ou menos bem-sucedida. O mesmo é válido para filósofos analíticos como Ludwig Wittgenstein e Bertrand Russel, que mataram a lógica ao transformá-la em linguística. O mesmo é válido para fenomenologistas como Edmund Husserl e Martin Heidegger, que consideram que “estudar a realidade” e “estudar a mente” são a mesma coisa. A lista é longa demais para ser exaurida num artigo como esse, e inclui grande parte dos filósofos dos últimos 200 anos.
O ponto desse artigo é relativamente simples. Alguns séculos atrás, Hume e Kant tentaram acabar com a razão, afirmando que há um abismo intransponível entre “o que é” e “o que percebemos”. Todo filósofo precisa escolher entre rejeitar completamente essa ideia, como Ayn Rand, e promover uma forma racional de pensar – ou aceitar essa ideia, seja qual for sua forma, e construir um sistema filosófico fadado ao fracasso. Não há diferença essencial entre alguém que afirma ser impossível conhecer a realidade, mas conclui devemos agir como se fosse, e alguém que afirma o mesmo, mas conclui que devemos agir de acordo.
O essencial é a adoção da dicotomia de Kant e Hume, e não o quão intensamente alguém a adota. Para denunciar o pós-modernismo pelo que ele é – um culto à irracionalidade – é necessário denunciar Kant e Hume como um todo. Tentar fazer um sem fazer o outro, que é exatamente o que a ideia de pós-modernismo possibilita, é apenas uma forma de ser sujo, mas chamar outra pessoa de mal lavado.
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Revisado por Matheus Pacini.
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[1] Para uma visão mais detalhada sobre o Pragmatismo, ver Pragmatismo, Progressivismo e o Fascismo Americano.