***Esse é um trecho da entrevista de Ayn Rand à revista Playboy. Ela está disponível na íntegra aqui***
PLAYBOY: Você já foi citada dizendo: “A cruz é o símbolo da tortura, do sacrifício do ideal para o não ideal. Eu prefiro o sinal do dólar.” Você realmente sente que 2000 mil anos de Cristianismo podem ser resumidos pela palavra “tortura”?
RAND: Para começar, eu nunca disse isso. Não é meu estilo, nem literária nem intelectualmente. Eu não digo que prefiro o sinal do dólar – que é um absurdo barato e, por favor, deixe isso em sua cópia. Eu não sei a origem dessa citação particular, mas o significado do sinal do dólar está claro em A Revolta de Atlas. É o símbolo do livre comércio e, portanto, de uma mente livre. Mente livre e economia livre são corolários. Um não pode existir sem o outro. O sinal do dólar, como o símbolo da moeda de um país livre, é o símbolo da mente livre. Mais do que isso, quanto à origem histórica do sinal do dólar, apesar de nunca ter sido provada, uma hipótese muito provável é que ele representa as iniciais dos Estados Unidos. Agora, você perguntou sobre a cruz cruz. O que é correto é que eu não considero a cruz um símbolo do sacrifício do ideal para o não ideal. Não é isso que ela quer dizer? Cristo, em termos de filosofia cristã, é o ideal humano. Ele personifica o que os homens devem se esforçar para imitar. No entanto, de acordo com a mitologia cristã, ele morreu na cruz não por seus próprios pecados, mas pelos pecados dos outros, do povo. Em outras palavras, um homem de virtude perfeita foi sacrificado por homens que eram viciosos e de quem se esperava ou deviam aceitar esse sacrifício. Se eu fosse cristã, nada poderia me indignar mais que isso: a noção de sacrificar o ideal pelo não ideal, ou a virtude pelo vício. E é em nome desse símbolo que os homens são convidados a se sacrificar por seus inferiores. Essa é precisamente a forma como o simbolismo é usado. Isso é tortura.
PLAYBOY: a religião, em sua opinião, nunca ofereceu nada de valor construtivo para a vida humana?
RAND: Enquanto religião, não – no sentido de crença cega, a crença não suportada nos fatos da realidade e nas conclusões da razão. A fé, como tal, é extremamente prejudicial à vida humana: é a negação da razão. Mas você deve se lembrar de que a religião é uma forma primitiva de filosofia, que as primeiras tentativas de explicar o universo, para dar um quadro coerente de referência para a vida do homem e um código de valores morais, foram feitas pela religião, antes que os homens estivessem desenvolvidos o suficiente para criar a filosofia. E, como filosofias, algumas religiões têm pontos morais muito valiosos. Eles podem ter uma influência boa ou princípios próprios para inculcar, mas em um contexto muito contraditório e sob uma base muito perigosa ou malévola: no terreno da fé.
PLAYBOY: Então você diria que se tivesse que escolher entre o símbolo da cruz e o símbolo do dólar, você escolheria o do dólar?
RAND: Eu não aceitaria tal escolha. Dito de outra forma: se eu tivesse que escolher entre a fé e a razão, eu nem mesmo considero a escolha concebível. Como ser humano, a pessoa escolhe a razão.
PLAYBOY: Você considera empresários ricos como os Fords e os Rockefellers imorais porque usam sua riqueza para apoiar a caridade?
RAND: Não. Esse é seu direito, se quiserem. Meu ponto de vista sobre a caridade é muito simples. Eu não considero isso uma grande virtude e, acima de tudo, não considero um dever moral. Não há nada de errado em ajudar outras pessoas, se e quando forem dignas de ajuda e você puder se dar ao luxo de ajudá-los. Considero a caridade uma questão marginal. Eu luto pela ideia de que a caridade não é um dever moral e uma virtude fundamental.
PLAYBOY: Qual é o lugar da compaixão em seu sistema filosófico?
RAND: Eu considero a compaixão adequada apenas para aqueles que são vítimas inocentes, mas não para aqueles que são moralmente culpados. Se a pessoa sente compaixão pelas vítimas de um campo de concentração, não pode senti-lo pelos torturadores. Se alguém sentir compaixão pelos torturadores, é um ato de traição moral para com as vítimas.
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Tradução de Roberto Rachewsky
Revisão de Matheus Pacini
Publicado originalmente por Playboy
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