A importância do trabalho na busca por uma vida com significado

O dia 01 de maio é mundialmente conhecido como o Dia do Trabalho. Essa data também marca o dia da trágica morte de Ayrton Senna: um ídolo do automobilismo que não só foi um piloto de F1 de sucesso, como também uma personalidade que conquistou a admiração e o carinho dos brasileiros.

Sua vida era seu trabalho. E seu trabalho, sua vida.

A atividade que Senna desempenhava com brilhantismo era reconhecidamente perigosa, e ele sempre esteve ciente disso. Perguntado se alguma vez temera morrer, respondeu que era mais fácil afirmar quantas vezes não tinha sentido tal temor. Mas isso não o impediu de desafiar a si próprio, de buscar a perfeição a cada corrida e, portanto, de ser um piloto formidável.

A genialidade no desempenho de sua atividade, a precisão na condução do carro e a dedicação para superar os próprios limites a cada corrida o colocavam em uma linha tênue entre a vida e a morte; o perigo era constante, mas estar no limite de suas capacidades o atraía.

Senna, pelas características já destacadas, e por tantas outras como ser um ótimo chefe e um amigo leal, ser incansável na busca por aperfeiçoamento, ter coragem para desenvolver com personalidade uma atividade perigosa, conquistou o fascínio dos brasileiros. Gostando-se ou não de F1, criou-se uma cultura no país: todo domingo, assistir às corridas de Senna na TV.

Essa coincidência entre a comemoração do Dia do Trabalho e o falecimento desse ídolo nos faz refletir, especialmente em meio a uma pandemia, que as pessoas se preocupam mais em buscar soluções que evitem a morte, mas que não, necessariamente, promovam a vida.

A realidade é que a morte é certa: é dolorosa, triste, inevitável. Mas é a realidade. Aconteceu com Senna, e acontecerá com todos nós. Por isso, o foco deveria estar na vida, no que faz com que a nossa existência seja realmente vivida, aproveitada, usufruída.

Afinal, o que significa viver?

Para Rand, o padrão de valor mais elevado para cada indivíduo é sua própria vida. Pensando nisso, e tendo como base o código ético integrado que Rand expõe em suas obras, faço algumas considerações.

Estar (biologicamente) vivo não é sinônimo de viver. Evitar a morte não significa viver.[1] E Senna é um grande exemplo disso. Se seu foco primário fosse evitar a morte, teria vivido da pior forma possível, sem concretizar seus valores. Senna morreu, vivendo. E viveu todos os dias pelos seus ideais, com inquietude, dedicação e superação. Por tudo isso, ele ainda inspira tantos brasileiros, mesmo depois de tantos anos de sua partida. Ayrton Senna foi um herói que buscava a sua felicidade, tendo a vitória como seu propósito de vida.

Viver é buscar constantemente a felicidade; e o propósito da moralidade é guiar cada indivíduo ao encontro de sua própria felicidade individual, apresentando valores e virtudes.

Para uma vida de virtudes, a racionalidade é necessária. E para exercer racionalidade é fundamental aperfeiçoar a relação entre consciência e realidade[2].

Rand, em A revolta de Atlas, nos apresenta as seis virtudes essenciais que derivam da virtude principal, a racionalidade: a independência, a integridade, a honestidade, a justiça, a produtividade e o orgulho. Dentre elas, este artigo destaca a produtividade. O trabalho produtivo, que subjaz a criação de valores materiais, é a atividade mais nobre do homem, já que é por meio dele que os bens de que precisamos são criados.

Aqui, não se soleniza algum trabalho específico. Todos os trabalhos produtivos são respeitados, já que o fundamental é a busca de uma carreira produtiva, com o uso sincero da mente, independentemente do grau de habilidade e de o esforço racional ser grande ou modesto[3], inclusive porque, na cadeia produtiva, todas as atividades acabam sendo essenciais. “Existencialmente, cada feito material contribui para a vida humana, uma vez que a torna cada vez mais segura, mais longa e/ou mais prazerosa. É impossível existir um homem que transcenda a necessidade de progresso, seja ele intelectual ou material”[4].

Ayn Rand tratou a produtividade como virtude, destacando o fato de que a produção material é um ato profundamente espiritual e grande expressão do espírito humano, fundamental para a felicidade individual. Em suas palavras, “o trabalho produtivo é o propósito central da vida de um homem racional, o valor principal que integra e determina a hierarquia de todos os seus outros valores. Razão é a fonte, a condição prévia de seu trabalho produtivo – orgulho é o resultado”[5].

Uma sociedade em que as pessoas reconhecem o valor da realização pessoal é uma sociedade que valoriza a produtividade. Afastar de um homem a possibilidade de produzir é muito mais do que lhe retirar o “ganha pão”. Se o trabalho é o processo que permite ao indivíduo atingir valores, ao impedi-lo de trabalhar – ou ao dificultar o processo, ele perde a ambição por seus valores, e isso é perder a sede de viver[6].

Prefiro seguir vivendo e, eventualmente, ser ‘surpreendida’ pela morte (afinal, mais cedo ou mais tarde, ela chegará), a, no intuito de dela tentar escapar, deixar de realizar as tarefas que fazem com que a minha vida tenha sentido. Fico com o legado de Ayrton Senna: uma vida em busca da conquista de valores e da satisfação pelo que realizou vale a pena.

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Revisado por Matheus Pacini e Bill Pedroso.

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[1] Quando Rand coloca a vida como valor último, ela não quer falar em simples sobrevivência. Ao contrário, todos os valores e virtudes são considerados de acordo com a sua capacidade de promover – ou não – a vida. Ou seja, a vida, segundo Rand, é o objetivo final, para o qual todos os demais intentos são meios.

[2] Sobre consciência e realidade, ver https://objetivismo.com.br/artigo/como-percebo-a-realidade.

[3] RAND, Ayn. The Virtue of Selfishness. New York: Signet, p. 29 (tradução livre).

[4] PEIKOFF, Leonard. Objetivismo: A Filosofia de Ayn Rand (OPAR). Porto Alegre: Ateneu Objetivista, 2000, p. 274.

[5] RAND, Ayn. The Virtue of Selfishness. New York: Signet, p. 27 (tradução livre).

[6] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V III, p.343.

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