Por que o pesadelo comunista não morrerá?

O dia de hoje marca o 100º aniversário da Revolução de Outubro, evento que deu início ao terrível e longo reinado global do comunismo. (Por razões obscuras relativas ao calendário desatualizado usado pela Rússia na época, a Revolução de Outubro aconteceu, na verdade, em novembro, sendo ela celebrada tradicionalmente na ex-URSS em 7 de novembro).

Um século de comunismo gerou quatro grandes resultados para aqueles que estiveram sob seu domínio: pobreza, opressão, guerra e matança.

Países liderados por comunistas – de China e Rússia a Cuba e Venezuela – ou foram da prosperidade relativa à miséria, ou foram isolados da prosperidade crescente de países capitalistas por décadas – mesmo às vezes sendo vizinhos desses, e compartilhando os mesmos benefícios geográficos e culturais. Pense no contraste entre Alemanha Oriental e Alemanha Ocidental, Cuba e Chile, China e Hong Kong e Coreia do Norte e do Sul.

Países comunistas impuseram regimes opressores, ditando o que todos deveriam ler, pensar e falar. Cientistas poderiam ser enviados aos Gulag caso lecionassem ideias proibidas pelo governo sobre genética. Dissidentes foram enviados para campos de concentração, sendo torturados, assediados, confinados em alas psiquiátricas e, por fim, assassinados. Quando conseguiam, artistas e intelectuais fugiam às centenas, buscando asilo em países não comunistas em busca da liberdade para exercer o seu ofício.

O comunismo fomentou dezenas de guerras civis e rebeliões brutais ao redor do mundo. Em diversos países com guerras intermitentes durante o final do século XX – Vietnã, Camboja, Angola, El Salvador, Afeganistão, etc – havia algo em comum: o comunismo. Consequentemente, ao fim da Guerra Fria vimos a maior queda no número de guerras e mortes causadas por elas desde o fim da II Guerra Mundial, bem como a criação de dezenas de novas democracias.

Acima de tudo, a história do comunismo é uma história de horrores em larga escala: o terrível holocausto ucraniano, os gulags de Stalin, a miséria total do período do Grande Salto Adiante da China, seguido do terror anárquico da revolução cultural chinesa, os campos da morte do Camboja são apenas alguns exemplos de uma longa lista. Estima-se que, nos últimos 100 anos, regimes comunistas tenham matado cerca de 100 milhões de pessoas.

Então, por que o pesadelo comunista não morrerá?

Uma pesquisa recente mostra que a maioria dos jovens desse milênio prefere o socialismo ou o comunismo ao capitalismo, e sabemos exatamente de onde vem a visão idealizada desses sistemas. O The New York Times, por exemplo, celebrou os 100 anos do comunismo – e “celebrar” parece ser a única palavra que se encaixa nisso – com uma série de retrospectivas sobre o ideal, o senso de propósito, o otimismo, a intelectualidade e a sensualidade da vida sob o comunismo.

O mesmo é feito com respeito à Inquisição Espanhola? Seria civilizado orgulhar-se do suposto “ideal” do Holocausto ou da “purificação” dos linchamentos da Ku Klux Klan?

A chave do problema pode ser vista até mesmo nas críticas dos conservadores a essa “hagiografia comunista”, na declaração de que o comunismo “não funciona”. Isso parece uma forma engraçada de eufemismo, o mesmo que dizer que se encharcar de gasolina e se incendiar “não funciona”. Parece que os adeptos do comunismo têm uma meta idealista, porém escolhem meios irrealistas, o que não é verdade: a sangrenta e assassina história do comunismo – e o fato de ele continuar vivo até hoje, após tantas décadas de ilusão – indica que opressão e matança sempre foram o seu objetivo.

Então, por que muitos acham que isso é “idealista”?

O fascínio pelo comunismo advém da promessa de unir na prática, num sistema social abrangente, duas ideias morais que a maioria das pessoas considera boas e nobres. Você, caro leitor, provavelmente as considera boas e nobres também – mas talvez seja melhor rever seus conceitos.

A primeira ideia moral é a de que o autointeresse é ruim, e que sacrificar seus próprios interesses pelo dos outros não é somente bom, mas a própria definição de moralidade. É por isso que lucrar e ganhar dinheiro são supostamente ruins. É por isso que tudo o que você tem e outro não tem é supostamente um “privilégio” injusto. É por isso também que o capitalismo precisa ser extinto, porque é um sistema inteiramente baseado no autointeresse.

A segunda ideia moral, e consequência política da primeira, é a de que os interesses privados são ruins e devem ser subordinados ao “interesse público”. É por isso que tudo que é privado é ruim (desde empresas privadas até escolas particulares) e tudo que é público é automaticamente bom. Por essa razão, autores renomados conspiram a favor da abolição da educação privada, exatamente como regimes totalitários fizeram, para garantir que todos “bebam da mesma fonte”.

O problema do comunismo não está no fato de ele ter distorcido esses ideais, ou de tê-los implementado mal. O crime do comunismo é, sim, tê-los levado a sério, implementando-os até a sua conclusão lógica. Isso é que as pessoas não querem encarar sobre a história do comunismo.

Cientificamente falando, o “experimento” comunista não fracassou. Ele produziu resultados claros. Tomou ideias básicas sobre moralidade e política e testou para ver o que ocorreria se fossem implementadas com consistência brutal. O comunismo foi testado em diversos países, em diferentes culturas e sob diferentes condições, e produziu o mesmo resultado sempre.

É isso que aprendemos, ou, pelo menos, deveríamos ter aprendido.

Aprendemos que um sistema baseado na abolição do interesse individual não leva à felicidade, mas a uma igualdade na miséria. Ao exigir que as pessoas sacrifiquem seu bem-estar e sua felicidade, que outro resultado esperar? O comunismo baseia-se na lógica de que “as punições continuarão até que a moral melhore”. Ele tenta construir a felicidade coletiva à custa do sofrimento individual.

Mas é claro que, sob o comunismo, ainda existem elites que se aproveitam do sistema para viver no luxo, enquanto o resto da população vive na miséria. Nicolás Maduro, da Venezuela, recentemente nos lembrou desse fato. Esse gordinho forte apareceu em rede nacional devorando uma empanada enquanto seus conterrâneos morrem de fome. Mas os luxos das elites se tornam possíveis quando há propaganda de que trabalho abnegado, dificuldades e sacrifícios devem ser feitos por todos em prol do “bem maior”. Se se diz às pessoas que elas não serão felizes, prósperas e seguras em suas atividades privadas, isso as torna vulneráveis à exploração de predadores como Stalin ou Maduro.

Isso nos leva a outra grande lição do comunismo: sem individualismo, não há base para direitos individuais ou qualquer outra garantia de dignidade humana. O grande erro que as pessoas cometem sobre o comunismo é pensar que se trata apenas da coletivização de propriedades (meios de produção). Na verdade, trata-se da coletivização de pessoas. Os países comunistas impõem sistemas de censura e interferem profundamente na vida pessoal de seus súditos exatamente por levarem a sério essa ideia da subordinação do indivíduo ao coletivo. Eles aplicam isso a tudo, inclusive ao que você pensa, o que, por sua vez, eles também tratam como propriedade pública.

A próxima grande lição do comunismo é que, sem liberdade individual, não há criatividade, apenas conformidade irracional. Não me lembro quem foi que citou o exemplo-mor do espírito comunista: uma loja soviética com o letreiro “Salão de Beleza nº 38”. Tudo no comunismo é monótono e impessoal, construído com indiferença pelas reais necessidades e desejos individuais dos seres humanos. Em parte, isso é fruto de seu sistema econômico, onde todas as decisões são tomadas por burocratas inacessíveis e indiferentes num sistema sem preços ou lucro para alinhar a oferta de bens e serviços das empresas às preferências de seus clientes. Mais profundamente, tudo isso falta porque, a princípio, as necessidades, os desejos e as preferências do indivíduo não importam.

Isso nos leva à mais profunda lição da história do comunismo. O interesse individual e o individualismo são apenas formas de dizer que a vida e a felicidade do ser humano individual têm valor. Descarte esses princípios, e a vida do indivíduo pode ser sacrificada, totalmente ou em parte, sem limites. Talvez um indivíduo precise ser torturado para o bem do sistema, ou trabalhar até a morte nos gulags, ou ser baleado na nuca e jogado em uma vala – afinal, você não pode fazer uma omelete sem quebrar alguns ovos, certo? E quanto mais ovos você quebra, menos cada ovo importa. “Uma única morte é uma tragédia; um milhão de mortes é uma estatística”. Ninguém sabe ao certo se o camarada Stalin realmente disse isso, mas sabemos que ele agiu segundo essa premissa.

O que o comunismo nos ensinou é que um sistema que não valoriza vidas individuais não valoriza, de forma alguma, a vida humana. E você não pode valorizar a vida humana individual sem valorizar sua felicidade, sua liberdade e seus interesses privados.

A única pessoa que compreendeu totalmente essas lições foi a imigrante russa Ayn Rand. Ela fugiu da União Soviética e partiu para os Estados Unidos com o objetivo de reviver o individualismo, construindo uma filosofia que redefinisse o significado e o status moral do interesse individual. Mais tarde, ela explicaria: “Stalin não corrompeu um ideal nobre… se trabalho e autossacrifício são apenas ideais morais, e se o “egoísmo” natural do homem só serve para que ele não se jogue em fornalhas por conta própria, então não há razão… pela qual um ditador não os colocaria na ponta de uma baioneta – pelo seu próprio bem, pelo bem da humanidade, pelas próximas gerações, ou até mesmo por um projeto de governo do último candidato eleito. Não há razão palpável para se opor à qualquer atrocidade. O valor de uma vida humana? Seu direito de existir? Seu direito de buscar a própria felicidade? Esses conceitos pertencem ao individualismo e ao capitalismo.”

Se o comunismo representa a implementação completa de uma visão moral comumente aceita, podemos entender melhor essa compulsão por inventar desculpas, alegar que nunca foi realmente tentado, esquecer os desastres e atrocidades causados por ele, aceitar apenas uma versão retocada de sua história e desejar desesperadamente que, se tentássemos só mais uma vez e realmente fizéssemos da maneira correta, finalmente alcançaríamos o paraíso.

Nós fizemos isso por um século inteiro, e até mais. Afinal, o comunismo foi tentado em pequena escala em comunidades voluntárias utópicas por mais de um século antes de fracassar e tomar conta de países inteiros.

É hora de começar a aprender as lições morais antes de sermos forçados a viver novamente o pesadelo de lutar pelo sonho comunista.

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Publicado originalmente em The Trancinski Letter.

Traduzido por Gabriel Persch.

Revisado por Matheus Pacini.

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