O que a direita pode aprender com Ayn Rand

Em The Federalist, Hunter Baker argumentou recentemente que os conservadores deveriam abordar as ideias de Ayn Rand com um pouco mais de “caridade cristã”, buscando reverter a tentativa de William F. Buckley e Whittaker Chambers, décadas atrás, de banir Ayn Rand da direita. Eu tenho algumas críticas ao seu texto, mas como defensor do Objetivismo de Ayn Rand, valorizo esse espírito. Tenho tentado fazer o mesmo com a Bíblia – abordando-a não com a “caridade cristã”, mas com um espírito de curiosidade intelectual. Meu objetivo não é refutar ou rejeitar a tradição judaico-cristã, mas sim entendê-la.

O artigo de Baker provocou uma resposta menos caridosa de Heather Wilhelm no RealClearPolitics. Falarei brevemente de suas caracterizações tendenciosas sobre a literatura e as ideias de Ayn Rand (preparem-se, fãs de A revolta de Atlas). O principal problema é o que ela descreve “o distanciamento tão desconfortável nos Estados Unidos entre muitos libertários – e a filosofia de um estado limitado em geral – e certos cristãos”.

Não me diga! Notícias recentes dizem que Mike Huckabee ameaça deixar o Partido Republicano caso eles não se disponham a defender a pauta do casamento gay.

Mesmo assim, Wilhelm reconhece que as diversas correntes de direita precisam trabalhar juntas em uma causa comum, dizendo: “o que une esses dois grupos — o fato de que um governo grande, burocrático e poderoso inevitavelmente sufoca a liberdade, esmaga a criatividade e destrói os direitos das pessoas — e esse foi provavelmente um dos poucos acertos de Ayn Rand”.

Serei generoso em minha resposta, concedendo que esse debate é necessário — e que gostaria de me aprofundar nele. Os conservadores deveriam examinar as obras de Ayn Rand de forma mais próxima e menos preconceituosa, levando as suas ideias mais a sério.

Permita-me começar sugerindo as cinco principais coisas que a direita deve aprender com Rand.

1. A importância crucial da razão

Em 1957, quando A revolta de Atlas foi publicado, ainda era radical alegar que a economia é impulsionada por inventores, pensadores e pessoas com ideias, e não pelo braço forte de operários sindicalizados (que é, em essência, a visão marxista). Hoje, na era da informação, essa visão praticamente se tornou clichê.

Não creio, todavia, que os conservadores tenham entendido esse ponto. Um dos maiores erros ideológicos já cometidos pela direita foi o de aceitar a autoafirmação da esquerda como defensora da razão e da ciência, representante do “planejamento racional”. Ao longo do século 20, era comum a direita aceitar o planejamento socialista como “racional”, alertando meramente para suas “consequências não intencionais” ou sua arrogância por confiar “demais” na razão.

Mas a noção de que a esquerda e suas políticas são “racionais” pode ser refutada pela observação dos resultados catastróficos em todos os lugares em que esse planejamento supostamente racional foi tentado, bem como pela recusa persistente da esquerda em aceitar esses resultados. Se eles estivessem conduzindo um “experimento” ousado – como cientistas de verdade! – também se recusariam a aceitar os seus resultados?

Ou melhor, é possível refutá-lo em dez minutos de conversa com o “esquerdista médio”, que está convencido de ter a ciência, a razão e a economia ao seu lado, porém não entende nada sobre esses assuntos.

Grandes defensores de livre mercado como Ludwig von Mises e Friedrich Hayek, desmascararam essa falsa “racionalidade”. Eles explicaram em suas obras como o planejamento central destrói planos racionais feitos por indivíduos em prol de planos de burocratas que jamais poderiam ter acesso a informações suficientes para coordenar as necessidades e os incentivos de milhões de indivíduos.

Ayn Rand, todavia, levou tal crítica ao nível filosófico, mostrando como a coerção é inerentemente inimiga do pensamento.

“Interpor a ameaça da destruição física entre um homem e sua percepção da realidade é negar e paralisar seu meio de sobrevivência. Forçá-lo a agir contra seu discernimento é como forçá-lo a agir contra a própria visão. … Não venham me dizer que sua mente os convenceu de que vocês têm o direito de forçar minha mente. A força e a mente são coisas opostas. A moralidade termina onde começa a forma da arma.”

Ela dramatizou essa premissa em seus romances, em particular nos capítulos finais de A revolta de Atlas, onde vemos a economia sendo destruída pelos decretos caprichosos de legisladores corruptos em pânico.

Mas ela não apenas criticou a racionalidade dos planejadores racionais; ela também questionou todo o código moral usado para justificar os controles governamentais. Isso nos leva à segunda lição a ser aprendida com Rand.

2. A patologia do altruísmo

É fundamental para todo tipo de defesa da liberdade contra os controles governamentais a compreensão de que as supostas “boas intenções” de planejadores, legisladores e estatistas do Estado de bem-estar social podem produzir resultados patológicos – isto é, o querer “ajudar o próximo” se torna um disfarce para paternalismo, busca de poder, capitalismo de compadrio, corrupção e perpetuação da dependência.

No ano passado, James Taranto, do The Wall Street Journal, escreveu sobre a necessidade de compreender o funcionamento desse tipo de “altruísmo patológico”. Como disse anteriormente, ninguém explicou tão claramente a natureza dessa patologia como Ayn Rand.

Mais uma vez, sua crítica ao altruísmo resume-se a fundamentos filosóficos. Ao contrário do que você deve ter ouvido, não se trata de uma crítica à benevolência ou à caridade. Pelo contrário, é uma crítica à ideia de que a sua própria felicidade não é um objetivo moral válido, ou seja, que todos devem viver em benefício dos outros. Conforme ela argumentou, isso cai por terra – tanto na teoria quanto na prática – já que ninguém teria o direito de ser feliz. Em um momento de confissão, Ellsworth Toohey, um dos vilões em A Nascente, descreve o ideal socialista desta maneira:

“Um mundo em que nenhum homem terá desejo próprio, mas direcionará todos os seus esforços para satisfazer os de seu vizinho, que, por sua vez, não terá nenhum desejo, exceto o de satisfazer os do próximo vizinho, que não terá nenhum desejo… pelo mundo afora, Peter. Uma vez que todos devem servir a todos… Que todos vivam pelos outros. Que todos se sacrifiquem e que ninguém lucre. Que todos sofram e ninguém desfrute.”

De maneira mais positiva, Ayn Rand reconhecia a importância da busca da felicidade como um objetivo moral da vida – que, afinal de contas, é algo que os pais fundadores dos Estados Unidos inseriram num dos documentos fundadores como um direito fundamental.

A busca da felicidade nos leva ao nosso próximo ponto, que é a principal maneira em que a maioria de nós busca a felicidade.

3. O significado do trabalho

Hunter Baker está errado em criticar Ayn Rand por “materialismo” e por “reduzir o valor do ser humano à produtividade econômica”. Eu mencionaria A Nascente aqui, onde a maioria dos “bonzinhos” não são homens de negócios, mas sim artistas e intelectuais, e onde também o herói passa boa parte da história encarando a pobreza a fim de manter a sua integridade artística. Isso não se encaixa em nenhuma definição de “materialismo” que conheço.

Mas Baker está certo ao destacar a defesa randiana do valor pessoal do trabalho produtivo, não apenas como uma necessidade para o progresso e a sobrevivência, mas como uma espécie de causa, como algo que dá sentido à vida. Ela não defendeu apenas o trabalho de líderes da indústria ou de arquitetos visionários. Conforme resumido por um de seus personagens: “não existe trabalho miserável, apenas homens miseráveis que não se dispõem a trabalhar.” (É óbvio que ela teria adorado Dirty Jobs de Mike Rowe.)

Um tratamento recente e muito superficial sobre a vida e as ideias de Ayn Rand descreve-a como a “deusa do mercado”, mas isso não é correto. Claro, ela tem seguidores em Wall Street. Mas Ayn Rand pode realmente ser encarada como a santa padroeira do empreendedor – o tipo de pessoa que tem uma visão clara do negócio que quer construir e que dedica anos de sua vida para torná-lo realidade.

Se você não entende o significado pessoal do trabalho, não entenderá porque tantas pessoas adoram os romances de Ayn Rand. Você também não entenderá o que guia suas prioridades políticas e culturais.

4. Uma terceira opção nas guerras culturais

A coisa que mais impede as pessoas de fazerem uma análise justa dos livros de Ayn Rand é o fato de ela não concordar com muitas das premissas que normalmente nos são oferecidas. Mesmo assim, as pessoas continuam tentando encaixá-la nessas falsas alternativas. Se ela defende os direitos dos ricos, ela odeia os pobres. Se ela não acredita no altruísmo, ela acredita que os fracos devem ser explorados. E por aí vai.

Provavelmente, a premissa mais importante que ela afrontou é expressa em: “Se Deus está morto, então tudo é permitido”. Ou seja: se não há base religiosa para a moralidade, então tudo é possível.

Basicamente, a esquerda cultural aceita essa opção, ficando do lado do subjetivismo (quando não tentam compensá-lo com seu próprio código neopuritano do politicamente correto). A isso a direita religiosa responde dizendo que a única maneira de impedir o “vale-tudo” é retornar à moralidade cristã.

Isso faz com que muitos procurem uma terceira opção. Como defensora de uma moralidade secular, é exatamente isso que Ayn Rand oferecia. Isso é particularmente notável em sua visão do sexo. Ela rejeitava as proibições puritanas contra o sexo, mas também rejeitava a visão de que o sexo é um ato materialista sem um sentido espiritual. Claro, seus romances são conhecidos por suas cenas de sexo. No entanto, ela se opunha à promiscuidade sexual, não porque pensasse que havia algo errado com prazer sensual, mas, como ela mesmo disse em sua famosa entrevista a Alvin Toffler na Playboy: “porque o sexo é muito bom e muito importante”, o que quer dizer que ela defendia sua própria forma de moralidade sexual não puritana.

Quanto às estranhas contradições do feminismo moderno, Ayn Rand deu vida a alguns dos melhores e mais fortes personagens femininos independentes da literatura (particularmente Dagny Taggart), mas ela não tinha envolvimento com o feminismo, em particular com o feminismo de Henry Higgins, que afirma que não deveriam ou poderiam existir diferenças entre homens e mulheres. Literariamente, Ayn Rand possui muitos aspectos do conceito “viva as diferenças!”.

Os conservadores podem discordar da perspectiva de Rand nessas questões, mas se eles forem capazes de dialogar e se relacionar com a vertente mais “libertária” da direita, influenciada por Ayn Rand, eles entenderão o porquê dessa vertente não escolher entre a esquerda subjetivista e a direita religiosa, e por que eles pensam que existe uma terceira opção.

5. A importância de grandes ideias

Ayn Rand é frequentemente criticada pelos grandes discursos filosóficos que inseriu em seus romances, mas seus críticos poderiam parar e pensar em quantas pessoas realmente leem livros de filosofia e se interessam, até mesmo com paixão, pelas grandes ideias. Ayn Rand não apenas injetou grandes ideias em seus romances. Ela acreditava na importância dessas ideias como força que transforma mentes e move a história, bem como na importância de dramatizar ideias na arte. A ideia de que “a política está a jusante da cultura” é algo que ela entendeu e defendeu por muito tempo antes de Andrew Breitbart.

A direita atual sempre reclama que a esquerda domina o terreno cultural e que precisamos fazer mais para influenciar a cultura popular. Mas Ayn Rand é a única figura “à direita” que teve sucesso nisso. Ela escreveu algumas das ficções mais populares e duradouras do mundo, que obtiveram sucesso no mercado – por mais de 70 anos, firme e forte – diante da implacável hostilidade dos críticos tradicionais. Ler seus romances é praticamente um rito de passagem para universitários e estudantes do ensino médio, e, na minha experiência, seus livros são o melhor mecanismo para trazer os jovens idealistas para a direita. Ela é um dos principais motivos da existência dessa vertente “libertária” na direita.

Então, em vez de meramente desprezar seu estilo literário, tente aprender um pouco com os seus acertos. (Se você quer começar – bem, eu já disse que estou escrevendo um livro sobre isso?)

Compreender o que a direita pode aprender com Ayn Rand significa também compreender o que uma certa fatia da direita já aprendeu com ela e entender sua perspectiva – o que certamente ajuda a manter um diálogo civil e manter uma aliança ideológica em oposição ao “governo todo-poderoso”.

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Publicado originalmente em The Trancinski Letter.

Traduzido por Gabriel Persch.

Revisado por Matheus Pacini.

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