O canto de liberdade de Ayn Rand

Em sua distopia Cântico, Ayn Rand relata a história do jovem Igualdade 7-2521 na primeira pessoa do plural, convidando-nos a experienciar a agonizante vida daqueles cuja individualidade é suprimida em favor do coletivismo, regime que permeou não só a Rússia comunista, berço de Rand, mas também a Itália fascista e a Alemanha nazista na primeira metade do século XX.

Igualdade, um jovem promissor cuja curiosidade e talento poderiam fazer prosperar sua vida e a daqueles que o cercam, cujas invenções poderiam contribuir para a comunidade e o progresso do mundo, vê-se suprimido pelo triste regime totalitário imposto por seu governo, na figura de um Conselho que representa a voz de toda a justiça e de todos os homens, e que, a despeito de seu potencial o destina à carreira de varredor de rua, onde, supostamente, apresentaria menor risco e ameaça ao sistema coletivista da época.

Conectando essa distopia a outra obra clássica, em As seis lições, Mises descreve que um regime coletivista como o socialismo impossibilita a mobilidade social, ou seja, as pessoas nascem fadadas a uma determinada realidade, e não lhes é dada a chance de mudarem seus status, progredirem e prosperarem. Neste sistema, tudo depende do talento e sabedoria daqueles que estão no poder, mas o conhecimento acumulado pela humanidade não é algo que uma única pessoa poderia deter. Essa concentração de poder resulta em estagnação.

Como uma fagulha mágica que pulsa no peito dos inconformistas, Igualdade cria uma lâmpada, invenção revolucionária que poderia trazer luz à escuridão que envolve a sociedade, mas a guarda em segredo temendo sofrer as penas da repressão praticada àqueles que ousavam ir além do que lhes fora designado. Ademais, tal invento tiraria o emprego dos acendedores de velas.

O capitalismo presente nas nações mais prósperas que conhecemos mostra que um sistema econômico que incentiva a concorrência e o livre mercado resulta em um leque de indivíduos, indústrias e setores em constante evolução. O que Mises também descreve é o que ocorre nos dias de hoje nos Estados Unidos, por exemplo, o berço das principais inovações e evoluções tecnológicas que fomos apresentados nas últimas décadas. Nesse sistema econômico, as pessoas e as indústrias estão constantemente se reinventando em busca de maior eficiência para oferecer à sociedade melhores bens e serviços, pois não é o altruísmo que as move, mas o seu desejo de prosperar, provocando uma constante busca por melhores padrões de vida. 

É essa liberdade econômica e seu ambiente empreendedor que fizeram emergir no Vale do Silício o epicentro da inovação global. Uma região onde a liberdade para empreender, experimentar e falhar é valorizada, em que existe uma cultura que celebra a diversidade de pensamento e os talentos individuais, cujo inconformismo produziu algumas das empresas mais influentes e disruptivas do mundo, que geraram prosperidade e melhora no padrão de vida de todo o seu ecossistema. Isso é totalmente diferente do que acontece em Cântico, onde o coletivismo mira no bem de todos e acerta na infelicidade e na miséria individual dos que o compõem.

Em uma passagem pelos campos, em mais um dia como todos os outros, como varredor de rua, Igualdade conhece Liberdade, na forma de uma mulher, e se apaixona por ela. Liberdade demonstra coragem e rebeldia ao desafiar as normas daquela sociedade, onde não poderia haver amizade ou afeto, já que estes levariam os homens a conexões e apoio mútuos, resultando em mais uma ameaça à homogeneidade do coletivo e reforçando a atmosfera de isolamento e alienação impostas pelo Estado.

As novas descobertas de Igualdade desencadearam sua busca pela realização pessoal e o início de sua rebelião contra as restrições impostas pelo regime coletivista, como um canto entoado pela alegria despertada pelo encontro da liberdade e da individualidade, que só lhe foram reveladas por meio do conhecimento e da consciência do ego, assim como a autora, que encontrou sua voz nos Estados Unidos, onde pôde enfim desempenhar seu potencial criativo e intelectual, livre da opressão e estagnação impostas pelo seu país natal.

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