O ato de se retirar

O mal é parasítico por natureza. É impossível produzir sem pensar, por isso quem rejeita a razão precisa encontrar meios para tomar o que é produzido pelo outro. Por conta dessa natureza parasítica, a manutenção de toda e qualquer liberdade depende de um tipo muito específico de ação: o ato de se retirar.

No contexto individual, isso se dá de forma literal. Se uma conversa, ou um relacionamento não tem valor, a melhor alternativa é simplesmente se retirar. No contexto social, esse tipo de ação toma diversas formas diferentes – cada qual com o fascinante papel de regular um sistema social.

No contexto econômico, por exemplo, você pode se retirar do mercado de crédito, liquidando seus empréstimos. Se os juros estiverem baixos demais para compensar o risco dos empréstimos, você pode simplesmente guardar o seu dinheiro embaixo do colchão, sinalizando tanto aos financistas quanto aos tomadores de empréstimo que, se quiserem crédito, terão de pagar mais. Uma moeda com lastro em dívida, cujo uso é imposto pelo Estado, acaba com essa possibilidade[1] – esse é o meio que tiranos utilizam para forçar indivíduos a emprestar.

No contexto da educação, “se retirar” equivale ao homeschooling – a prática de ensinar seus filhos em casa. A especialização profissional é sinônimo de maior eficiência no trabalho. Por isso, é de se esperar que professores especializados, trabalhando para uma empresa especializada, forneçam uma educação superior. O homeschooling não é apenas uma “forma alternativa” de educação – é o reconhecimento de que, apesar de todas as vantagens da especialização, o sistema educacional se tornou uma alternativa pior do que ensinar seus filhos em casa. Tornar a prática ilegal, ou mantê-la em uma “área cinzenta” da lei (como é o caso no Brasil) elimina essa possibilidade – esse é o meio que tiranos utilizam para forçar pais a submeter seus filhos à doutrinação.

Seja qual for o contexto particular, a lógica é sempre a mesma, porque a essência é sempre a mesma. Indivíduos honestos se beneficiam da interação entre si, e estabelecem instituições para mediá-las. Uma instituição honesta não precisa de força para ser adotada. Muito pelo contrário: é a constante ameaça da “retirada” desses indivíduos que mantêm honestas as pessoas encarregadas de uma instituição. Instituições desonestas não sobrevivem por muito tempo, a não ser que retirem a possibilidade de escolha – e a única forma de retirar a escolha é através da ameaça de violência física.

A instância mais fundamental de “se retirar” é o ato de se retirar de seu governo, porque o propósito de um governo honesto é justamente a proteção do indivíduo contra a violência física. Essa escolha é retirada, primeiro, pela cobrança de impostos, e, segundo, pela proibição da posse de armas. Se você considera seu governo incapaz, ou indisposto a defender seus direitos, você deve ser capaz de se recusar a fazer parte dele, o que significa manter o dinheiro que usaria para financiá-lo, usando-o para defender seus direitos de forma privada. Se a situação é ainda pior, e as próprias leis que regem o governo promovem a violência contra indivíduos pacíficos, você tem o direito de organizar uma milícia, e confrontar diretamente esse governo.

Confrontar o próprio governo não é uma fantasia romântica e remota, mas uma necessidade real e quotidiana, e a razão por trás da segunda emenda da Constituição dos Estados Unidos. O brasileiro ainda está longe de ter seus direitos garantidos por uma boa constituição, mas jamais alcançará esse feito sem, primeiro, aprender a desobedecer seus governantes.

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Revisado por Matheus Pacini.

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[1] Para uma explicação mais detalhada sobre como uma moeda fiduciária elimina a possibilidade de poupança, ver Um Remédio para a Doença Subjetivista de Mises e Hayek

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