Não brinquem com os preços

Imagine uma sociedade onde o preço do tomate está alto, digamos que R$8/kg. Nesta sociedade, há um sujeito chamado João (sempre é o João), que é produtor de tomates. Na visão da população, João é considerado o culpado pelo preço alto do tomate: que ganancioso é o João! Isso até pode ser verdade, João pode estar cobrando um preço bem acima do normal, ou talvez o custo de produção do tomate esteja bem próximo ao preço praticado por João, mas de nada adianta julgarmos as decisões dele.

O governo, querendo fazer com que todos tenham acesso ao tomate, decide tabelar o seu preço. Está definido que os produtores de tomate não poderão cobrar mais que R$ 6/kg. A população vibra. Aparentemente, o governo está ouvindo as suas preces!

É uma pena, no entanto, que essa intervenção abra um grande número de possibilidades. João pode aceitar essa intervenção, vendendo pelo preço mais baixo, mas agora ele tem um incentivo a vender seu produto informalmente pelo seu preço original, ou até abandonar a produção de tomates para trabalhar no cultivo de cenouras.

De qualquer forma, o resultado pode ser o contrário do pretendido pelo governo: os produtores buscarão outras oportunidades de lucro, os mercados ficarão sem tomates, e a população que conseguirá comprar tomates será ainda menor. Sorte para os mal-intencionados: já imaginou se decidirem criar uma grande rede de tráfico de tomates?

Se você acha que isso só ocorre quando a intenção do governo é ajudar o consumidor, pensou errado. O governo pode ser muy amigo de grandes empresas: se João decidir pedir ajuda ao governo, solicitando um aumento do preço do tomate, João pode entrar numa enrascada: o consumo do tomate pode simplesmente diminuir, ou ele pode até ganhar novos concorrentes caso o consumo se mantenha estável.

O Brasil intervencionista

Na terra da intervenção de preços, não faltam exemplos.

Voltando no tempo, temos o Plano Cruzado de Sarney em 1986. Em uma época de inflação galopante, o congelamento de preços foi a gota d’água para muitos empresários desistirem de produzir. Segundo o cientista político Bruno Garschagen, essa foi a época em que a  “fila” se tornou patrimônio nacional. Havia fila nos supermercados, nas feiras, nas distribuidoras de gás, nos postos de gasolina e até nos carrinhos de picolé.

Anos depois, Dilma não deixou passar em branco a ideia de congelar preços. A “presidenta” praticou o congelamento de preços da Petrobras de 2011 até o final de 2014. Só nessa brincadeira, houve um prejuízo de R$ 71 bilhões de reais à empresa, valor maior até que as estimativas dos últimos desvios de corrupção da estatal.

Ainda nesse ano, os “liberais” (será?) Bolsonaro e Macri também quiseram deixar sua marca. O presidente argentino resolveu congelar o preço de 60 itens da cesta básica por seis meses, e pode colocar o país em um caminho semelhante ao da Venezuela. Enquanto isso, Bolsonaro aparentemente tentou imitar Dilma Rousseff e vetou um reajuste da Petrobras no preço do diesel. No mesmo dia o mercado respondeu, e as ações da estatal fecharam em queda de 8%. Após a turbulência, Paulo Guedes comentou que o presidente aprendeu a lição.

O que fazer então?

Seria injusto não reconhecer a “lógica” dos argumentos em defesa à interferência nos preços. O preço fixado pode parecer uma solução para o consumidor pagar menos, além de auxiliar o cálculo de custos e receitas do empresário. Não é à toa que os caminhoneiros estão brigando pelo tabelamento de fretes, e que a população esteja constantemente pedindo a diminuição no valor do combustível. Mas é preciso enfatizar que qualquer medida que interfira nos preços altera algum fator significativo da economia – e isso raramente é bom.

Para o economista Donald Boudreaux, o sistema de preços, quando pode funcionar livremente, é um engenhoso método de comunicação e coordenação capaz de aprimorar as condições de vida dos seres humanos. Isso porque a formação de preços é um processo social, onde cada consumidor colabora em sua elaboração.

A interferência governamental nesse processo é, portanto, uma distorção no processo social que resulta em uma informação falsa com respeito ao que está acontecendo na sociedade. É por isso que devemos ter cuidado ao pedir a interferência do governo, mesmo quando queremos um preço mais justo, pois a verdadeira formação de preços só pode acontecer enquanto estiver na mão do mercado e do consumidor.

Medidas como o tabelamento de fretes, por exemplo, podem criar um incentivo para as empresas comprarem caminhões próprios, deixando de contratar transportadoras ou freteiros. A diminuição artificial no valor do combustível também pode distorcer a lógica dos preços e fazer com que todos paguem pelos prejuízos da Petrobras. Lembre-se de que não há como uma empresa vender seus produtos por um preço mais barato do que seu custo por tanto tempo. Por sorte (e para nosso azar), a estatal pode contar com a ajuda dos impostos para bancar suas contas.

A nossa única alternativa é abraçar medidas como a abertura comercial, a diminuição de impostos, o fim dos subsídios, a desburocratização, a defesa de uma moeda mais forte (afinal, o Real pode até ser mais estável do que o Cruzado, mas não é nenhum franco suíço) e outras medidas de longo prazo que facilitam a entrada de novos concorrentes no mercado, mantêm o nosso poder de compra e tornam os preços mais atrativos para a população.

Portanto, como membro consumidor e parte desta interação social que conhece as trágicas possibilidades das políticas econômicas, faço um encarecido pedido para aqueles que tratam de emitir leis, decretos e tabelamentos em nosso país: por favor, estudem essas medidas e não brinquem com os preços.

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