Francisco D´anconia, dinheiro e moralidade

Francisco d’Anconia diz que “a expressão ‘fazer dinheiro’ resume a essência da moralidade humana”. O que ele quer dizer com isso? Quais são as atitudes morais prevalentes hoje em relação ao dinheiro? Você concorda com a opinião de Francisco? Justifique.

Hoje, as atitudes morais em relação ao dinheiro são totalmente contraditórias e podem facilmente ser representadas por estas três afirmações: “você tem muita sorte”, “aprenda amar a si próprio” e “o dinheiro não compra felicidade”. Sob esta ótica, concordo plenamente com Francisco d’Anconia que “a expressão ‘fazer dinheiro’ resume a essência da moralidade humana”.

Um exemplo adequado que é tanto pessoal quanto análogo a essa discussão é o daquilo que muitos chamam de “sorte”. Eu desprezo esse termo; ou melhor, eu o desprezo diante das condições e do contexto em que é utilizado pela maioria. Para cada feito que realizei, cada prêmio que conquistei, sempre houve alguém que utilizasse esse termo para subestimar minhas conquistas, como se, em vez de ter conquistado algo com o meu próprio esforço, eu estivesse apenas “no lugar certo, na hora certa, com o universo conspirando a meu favor”. Quando alguém diz que tive sorte em conseguir algo, encaro-o seriamente e fico com vontade de perguntar “o que me faz sortuda?”. Eu sou a primeira “americana” da minha família a ingressar em uma universidade – e que, por sinal, conquistou uma bolsa integral numa ótima universidade. A bolsa de estudos que obtive foi concedida aos melhores estudantes universitários de primeira geração, que não só se destacaram academicamente e demonstraram grande potencial de liderança, mas também superaram grandes dificuldades socioeconômicas. Dizer a alguém como eu que o produto das minhas realizações se baseia na “sorte” é uma forma de ridicularizar cada segundo que já gastei para ter o que tenho, e cada gota de sangue, suor e lágrimas que já derramei para investir no meu futuro – estudando enquanto meus amigos estavam se divertindo, trabalhando horas extras para ajudar a sustentar minha família, etc. Eu sou sortuda? Tenho sorte por ter passado por dificuldades? “Sorte” é um termo que as pessoas usam como escudo para justificar a sua própria falta de conquistas. Dizer que alguém tem sorte é implicar que os outros não têm, uma maneira adicional pela qual os “que não fazem” subestimam as conquistas dos “que fazem”. O que os outros chamam de “sorte”, eu chamo de coragem, força de vontade, sacrifício, perseverança e capacidade própria. É o que eu chamo de “merecimento”.

“Ganhar” é um termo que d’Anconia usou ao explicar o significado de “fazer dinheiro”. Por “ganhar”, refiro-me a ter investido energia, esforço e tempo para “chegar lá”, ou seja, proclamar uma vitória pessoal e poder dizer “eu fiz tal coisa”, “eu criei tal coisa”, “eu conquistei tal coisa”, seja ela dinheiro, propriedade tangível ou intelectual, ou qualquer outra conquista pessoal. Amar o que você conquistou é a maior homenagem que pode ser feita ao homem, posto que é um reflexo da habilidade humana, ou, como d’Anconia diria, “Amar o dinheiro é conhecer e amar o fato de que ele é criado pela melhor força que há dentro do indivíduo”. Amar as suas próprias habilidades é também amar a si próprio. Dessa forma, origina-se uma das maiores contradições de nossa sociedade: o conceito de amar a si mesmo. Somos constantemente bombardeados com campanhas comerciais e publicações presunçosas de justiceiros sociais no Facebook sobre “aprender a amar a si próprio”, mas a ironia é que, quando você o faz, eles o chamam de “egoísta” e “convencido”, porque amar a si próprio significa ser dono de si próprio, isto é, livrar-se da propriedade que a sociedade crê ter sobre você. Quando as pessoas lhe dizem, de forma vazia, para “amar a si próprio”, o melhor caminho é este: seja dono – de sua beleza, de suas habilidades, de seu intelecto e de suas conquistas. Quando você conseguir ser dono de si próprio, entenderá que não precisa se desculpar por ter dinheiro, pois ele é fruto desse amor-próprio, de suas habilidades e de suas conquistas. Ou, como d’Anconia coloca, não deixe o ideário dos saqueadores fazer com que você passe a encarar suas maiores realizações como um estigma vergonhoso, e sua prosperidade, como culpa.

Quando Francisco defende apaixonadamente a frase “ganhar dinheiro”, ele está elogiando, ao mesmo tempo, o homem com habilidades e seu direito de possuí-las. Ele está se referindo ao self-made man, “ao homem que faria sua própria fortuna independentemente de seu início”, e que não é apologético por ser rico, nem por possuir e amar o que conquistou. Como ele diz, “os que amam o dinheiro estão dispostos a trabalhar para ganhá-lo. Eles sabem que são capazes de merecê-lo”. Ele destaca os EUA como o “país do dinheiro”, precisamente pelos mesmos motivos que levam milhões de imigrantes ao país todos os anos: o sonho americano, a oportunidade de fazer dinheiro e de se tornar um self-made man. Quando ele diz a Hank Rearden: “Se o senhor quer ver um princípio abstrato, como a ação moral, sob forma material, olhe para lá”, em referência a Rearden Steel, eu acho que “América” poderia ser adaptado, porque “América” na verdade se refere ao país onde as coisas são criadas, o país onde as pessoas vão para criar, o país onde as pessoas entendem que “a riqueza tem que ser criada”.

Ganhar dinheiro é uma celebração da capacidade humana. Apesar disso, as atitudes atuais em relação ao dinheiro parecem afirmar o contrário. A filosofia atual é a de que “o dinheiro não pode comprar felicidade”. Por outro lado, Aristóteles afirma que a felicidade é o exercício da virtude, e Francisco d’Anconia afirma que “o dinheiro é produto da virtude”. Por essa lógica, não seria o dinheiro o produto da felicidade? Se você consegue derivar felicidade da sua capacidade de criar, e o dinheiro é o produto dessa habilidade, então, quando você compra o produto de outro homem que é feito de sua habilidade, você não estaria comprando felicidade? Indubitavelmente, diz d’Anconia:

“O dinheiro não compra felicidade para o homem que não sabe o que quer, não lhe dá um código de valores se ele não tem conhecimento a respeito de valores, e não lhe dá um objetivo se ele não escolhe uma meta. O dinheiro não compra inteligência para o estúpido, nem admiração para o covarde, nem respeito para o incompetente.” O dinheiro não é capaz de satisfazer o homem que busca algo indefinido. Não é capaz de ajudar o homem que procura cegamente. Para todas as intenções e propósitos, a felicidade que a sociedade parece se referir é uma felicidade abjeta que é inatingível por qualquer outro meio que não seja criá-la você mesmo, o que ironicamente é o que eu acredito que Francisco queira dizer com “ganhar dinheiro”. Isso significa a capacidade de criar sua própria felicidade.

Tudo que o dinheiro representa é um reconhecimento da capacidade humana de criar e produzir, porque “a riqueza é produto da capacidade humana de pensar”. É um intercâmbio de esforços. Esta é a essência da moralidade humana: ser capaz de acreditar e confiar nos melhores esforços de outro homem, e o reconhecimento de que você também terá dado o seu melhor nessa troca. O dinheiro é a manifestação física dessa troca de esforços, ou melhor:

O dinheiro é a forma material do princípio de que os homens que querem negociar uns com os outros precisam trocar um valor por outro […] Comerciar por meio do dinheiro é o código dos homens de boa vontade.

Francisco d’Anconia questiona, em relação ao herdeiro que é destruído por sua riqueza por não ser igual a ela: foi o dinheiro que corrompeu o herdeiro, “ou foi o herdeiro que corrompeu seu dinheiro”? Aqui creio que ele queira dizer que, quando você não dá o melhor de si, mas ainda espera o melhor dos outros, é nesse momento em que o dinheiro é corrompido. Nesse sentido, afirmar que as conquistas de alguém são simplesmente uma questão de sorte significa impensadamente que aqueles que não conseguiram, não tiveram sorte. A questão deixa de abordar a troca de esforços, resumindo-se à sorte. Você não pode ter sorte, e você não pode produzi-la – até mesmo aqueles que vencem em jogos de baralho ao contar as cartas ganham por esforço, pois encontraram uma maneira de fazer com que o resultado final não fosse uma questão de sorte, mas sim de habilidade. Negar o dinheiro é negar a si mesmo, negar e privar-se do amor próprio, da felicidade, entregando sua vida ao acaso. Seguindo as palavras de Hank Rearden, em que ele afirma: “Recuso-me a pedir desculpa por ser mais capaz – não aceito pedir desculpa por ter tido sucesso –recuso-se a pedir desculpas por ter dinheiro”, apesar das pressões e expectativas sociais da sociedade atual, eu também me recuso a pedir desculpas pela minha própria habilidade.

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Publicado originalmente em Ayn Rand essay contest.

Traduzido por Gabriel Persch.

Revisado por Matheus Pacini.

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