Atlas não se rebelou: só deu de ombros

Pode lhe surpreender, mas Atlas não se rebelou: só deu de ombros.

Estas são algumas das anotações pessoais de Ayn Rand para si mesma, rascunhadas em 18 de julho de 1946. Nesse momento, estava organizando e documentando suas ideias enquanto escrevia sua obra-prima, A Revolta de Atlas. Nessas notas vemos claramente que os criadores no romance não se “revoltam”, mas, simplesmente, desaparecem. Daí surge a polêmica sobre o título mais adequado para a obra – A Revolta de Atlas ou Quem é John Galt?[1]

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A razão por que a sociedade em minha história não se afunda em violência e guerra civil (como seria provável na realidade histórica) é que, mesmo uma guerra civil só é causada por algum elemento de independência entre os homens, algum impulso ativo, por mais equivocado que seja. É esse elemento que influencia na decisão de uma rebelião, quando se dão conta de que a situação é insustentável, e que não podem permitir que continue, e que há de fazer algo. Assim que recorrem à violência, por pura cólera e desespero, sendo a violência o único recurso contra os parasitas (posto que a razão já foi descartada pelos parasitas, cuja a única arma é a própria violência).

Portanto, é necessário algum tipo de criador – homem de ação ou decisão, até certo ponto – para conduzir os homens à rebelião e à guerra civil. Isso é o que ocorre na história quando o coletivismo, o império do parasitismo, torna-se insuportável. (Ademais, são os parasitas que recorrem à força quando precisam de mais dinheiro, buscando conseguir maior produção através do terror). Ao longo da história, todavia, as sociedades têm sido uma mescla; nenhum princípio é observado consistentemente, e o individualismo só funciona por omissão do governo. Isso é o que mantem os criadores na sociedade: a esperança de ter uma oportunidade ocasional. Mas isso já não é verdade no coletivismo atual, como na Rússia ou Alemanha.

(Um detalhe secundário: só há dois incentivos possíveis para a ação humana: o desejo de obter algo, ou o medo. Mas o medo só funciona, temporariamente, ao nível de subsistência mais miserável (sob o tipo mais inútil de homens), e só enquanto houver produção dos homens livres que possa ser saqueada ou copiada. Logo, só há um incentivo para os homens: a ganância, o desejo pessoal.

No romance, os criadores não tentam cooperar com uma sociedade regida por parasitas até chegar a ser insuportável para se revoltarem como fariam na história real. Os criadores simplesmente dão de ombros, se retiram. O que sobra da humanidade sem eles é incapaz de produzir ou se revoltar. No romance, portanto, o mundo acaba, não em violência, mas em lenta putrefação: desintegração, corrupção e decomposição, afinal, uma sociedade sem inteligência funcionando é um corpo sem vida). É a putrefação da estagnação, da queda, do cinza e do sombrio. Tenha isso muito presente. Não coloque demasiada violência emocional em Taggart e os de sua laia: mesmo suas crises e tragédias são podridão sem cor. Sem os criadores, o mundo para.

Só se deve ressaltar que o único curso natural, essência e última esperança dos parasitas é a violência. Isso fica claro na cena de tortura, nas conversas no laboratório do professor, e nas insinuações vis e vergonhosas sobre suas intenções (inclusive, Cuffy Meigs). Mas não há ninguém contra quem eles possam praticar a violência: os criadores estão fora do seu alcance, deixando os parasitas à sua própria sorte. O que sobra da humanidade é um rebanho miserável e trêmulo, que não vale a pena aterrorizar, porque já está aterrorizado e predisposto a obedecer (sem violência); de fato, o único que o rebanho quer é obedecer, mas não há ninguém que ensine aos parasitas que ordens dar. O rebanho que restou nem vale a pena dominar, pois nem sequer são capazes de produzir algo que os parasitas possam saquear.

Tudo isso deve ficar claro na obra.
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Traduzido por Matheus Pacini

Publicado originalmente em Ayn Rand Letters.

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[1] RAND, Ayn. The Journals of Ayn Rand.

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