Uma Atitude Pro Liberdade ao Lidar com Doenças Infecciosas

É verdade que o Brasil é um país que possui muitos problemas, e que muitos deles já foram abordados de forma melhor por outras nações. Porém, o cenário atual de crise do SARS-CoV-2 demonstra o quanto a humanidade está se afastando dos princípios de liberdade e do direito da busca pela felicidade individual.

Em resposta às ações tomadas pelo governo americano, o Ayn Rand Institute publicou um artigo de autoria do filósofo Onkar Ghate em que esclarece como poderíamos ter uma atitude pró-liberdade ao lidar com a ameaça de doenças infecciosas.

Baseado nesse artigo, gostaria de resumir os principais pontos que acredito serem de extrema importância para o contexto brasileiro:

  • PRECISAMOS EXIGIR UMA ATUAÇÃO MELHOR DO GOVERNO

Igual que em muitos países, a resposta americana ao vírus pressupõe que a coerção governamental é única forma de se enfrentar o problema, uma posição que gera consequências devastadoras. Ao tomar medidas baseadas em evidências contraditórias, o governo optou por se esquivar da responsabilidade por seu despreparo e reagiu sob a influência do medo. Porém, muito antes das ações autoritárias do governo, a maioria das pessoas já praticava medidas voluntárias para diminuir a transmissão do vírus.

Para garantir uma resposta racional das autoridades, precisamos de novas leis especificando as responsabilidades do Estado, assim como princípios claros para testar, rastrear e isolar os infectados. A importância das leis é que delimitam o poder do governo através de princípios claros e objetivos.

  • A LEI DEVE SER FOCADA NO PAPEL DO GOVERNO EM INTERROMPER A AMEAÇA IMPOSTA POR DOENÇAS INFECCIOSAS.

É preciso definir quando doenças infecciosas são uma ameaça. Doenças infecciosas são parte da condição humana e devem ser combatidas, mas são diferentes de doenças como câncer ou diabetes. Isso porque uma pessoa pode atuar de maneira ativa na propagação da doença e essa condição exige uma resposta proativa do governo.

Porém, nem todas as pessoas portadoras de uma doença infecciosa deveriam ser consideradas como uma ameaça. Em se tratando de pessoas infectadas pela gripe, por exemplo, cabe a cada indivíduo tomar as medidas necessárias para evitar seu contágio devido à baixa severidade da doença.

Assim, devemos levar em conta os seguintes aspectos para identificar uma doença que exige intervenção legal: O quão contagiosa é a doença? Como a doença é transmitida? Que tipo de dano ela pode trazer para a pessoa infectada? Qual é o nível de imunidade encontrado na população? Quais medidas preventivas são conhecidas e fáceis de serem aplicadas?

Essas respostas irão ajudar a responder à pergunta sobre quando medidas coercivas são necessárias. E o governo tem a responsabilidade de catalogar e monitorar essas doenças com o intuito de tomar decisões efetivas e adequadas.

Da mesma maneira, é preciso delimitar quais são as intervenções coercivas apropriadas quando uma doença severa é identificada. A lei também deve especificar os meios a serem utilizados, assim como o tipo e a quantidade de evidência necessária. Apenas quando esses pontos forem retratados em lei, as responsabilidades e o limite do governo estão claros. E essa responsabilidade se traduz em uma única tarefa: testar, isolar e rastrear as pessoas infectadas.

  • NA PRÁTICA, LEIS ADEQUADAS TERIAM GARANTIDO QUE O GOVERNO ESTIVESSE PREPARADO PARA TESTAR E ISOLAR PESSOAS COM O SARS-CoV-2.

Com leis melhores, seria possível que o governo americano tivesse o mesmo nível de preparo de Taiwan. Isso porque o país aprendeu com as lições da crise SARS-CoV-1 em 2003 e implementou novas leis e estratégias. Assim, semanas antes da Organização Mundial da Saúde declarar estado de emergência, Taiwan enviou sua própria equipe para investigar os relatórios suspeitos sobre uma nova doença respiratória vindos de Wuhan, na China. Como consequência, até o dia 18 de junho, o país reportou 446 casos da doença e 7 mortes. Restaurantes e lojas continuam abertas e escolas foram fechadas por apenas duas semanas.

Com leis melhores, o governo americano também teria tido uma habilidade estratégica de teste tão disseminada quanto a da Coréia do Sul. Após a crise da Síndrome Respiratória do Oriente Médio em 2015, A Coréia do Sul instituiu reformas legais, resultando em uma rápida ação na crise do SARS-CoV-2. Muito do sucesso da estratégia do país se deve ao reconhecimento governo de que testes devem ser feitos de maneira ampla, mas o governo não deve controlar todos seus aspectos. Logo, desde o começo da crise, o país buscou parceria com empresas privadas e removeu obstáculos burocráticos.

Já nos EUA, o governo desenvolveu seu próprio teste, impedindo ativamente que laboratórios universitários e empresas privadas desenvolvessem alternativas, resultando na falta de dados sobre a propagação da doença e ineficácia no isolamento de infectados. É fato que governos devem avaliar a efetividade de novos testes, assim como as empresas privadas e seus próprios usuários.

Feito de forma estratégica – aplicando testes em locais com alto índice de transmissão – o resultado seria a interrupção ou desaceleração do contágio e a redução da carga sobre os hospitais e profissionais da saúde. Assim, a lei deveria exigir que departamentos de saúde tratem a ameaça de doenças infecciosas como um fenômeno local, que pode se propagar.

  • QUANDO O GOVERNO É INCAPAZ DE CONTER A MAIORIA DOS PORTADORES DE UMA DOENÇA INFECCIOSA, A LEI DEVE DEIXAR AS PESSOAS LIVRES PARA AGIR.

Não existe nenhuma garantia de que o governo será capaz de testar, isolar e rastrear um número suficiente de portadores para conter uma doença infecciosa. Talvez o fator mais importante a ser levado em conta ao formular uma nova lei é o fato de que muitas coisas são desconhecidas numa pandemia.

Algumas ações coercitivas podem ser legítimas como o isolamento do indivíduo que apresenta sintomas e o uso de máscaras. Da mesma maneira, medidas como essas também podem ser tomadas por indivíduos e organizações privadas. O objetivo da lei nestes casos continua o mesmo: neutralizar os portadores da doença. A diferença é que o governo é incapaz de isolar apenas os indivíduos contaminados.

Assim como quando um roubo acontece em um determinado bairro e a polícia não é capaz de determinar o ladrão, o governo não tem o poder prender os supostos criminosos ou de impor um toque de recolher na tentativa de prevenir um novo crime. No caso de patologias, a medida a ser tomada pelo governo é de divulgar informações sobre a doença com o objetivo de ajudar o indivíduo a tomar as devidas ações preventivas.

Se acreditamos que, quando uma nova doença infecciosa aparece, o objetivo legal do governo é de minimizar o número de mortes pela doença, então, o governo precisa do poder coercitivo para fechar tudo e implementar a quarentena para todos. Ele precisa de poder quase absoluto. Porém, esse poder não é legítimo.

Considere o que acontece com as doenças infecciosas já existentes como a gripe. É verdade que o Sars-CoV-2 não se comporta como a gripe, mas, ainda assim, o número de pessoas que é hospitalizada e que morre pela doença é considerável. Apesar disso, não exigimos que o governo faça de tudo para que elas não aconteçam.

Em uma sociedade livre, as decisões de como proteger sua saúde e mitigar riscos de contaminação são de responsabilidade do indivíduo, não do governo. Em uma perspectiva ampla, podemos levar em consideração quais os componentes são necessários para se ter uma saúde mental e física. Uma boa dieta, exercícios, convívio com amigos e família? As repostas para essas questões representam o que a busca da felicidade significa para cada indivíduo no contexto da sua saúde. E, nesse caso, o papel do governo continua o mesmo: garantir a liberdade individual.

Existe uma diferença significativa entre indivíduos tomando ações voluntárias e o governo tomando medidas coercivas. Isso se deve ao fato de que não existe a “nossa saúde” ou a “nossa riqueza”. O que existe é a saúde e a riqueza específica de cada indivíduo. Exigir que o governo encontre um meio termo entre esses dois aspectos é como exigir que ele decida quem vai ser sacrificado às custas de outra pessoa. O modelo ideal de igualdade perante a lei significa que todos possuem os mesmos direitos e as mesmas liberdades, e o papel do Estado é de assegurar e proteger esse modelo. Em situações onde uma política pública nos é colocada como melhor, devemos nos perguntar “melhor para quem?”

Outro aspecto da falta de leis no combate ao SARS-CoV-2 foi a ausência de informação e evidências oferecidas para se implementar o confinamento obrigatório. Muitas dessas informações não foram divulgadas de maneira clara, como os modelos de pesquisa utilizados, o objetivo e a duração do confinamento, métodos e estratégias para testes e evidência da possível superlotação de hospitais.

Quando o governo controla tantos aspectos da saúde pública, ele deve ser transparente e honesto sobre o que consegue administrar ou não. Em uma situação diferente, o lucro seria o motivador para que o setor da saúde crescesse e conseguisse lidar com o problema. Assim como aconteceu com muitas empresas de tecnologia que melhoraram significativamente seus serviços durante a pandemia devido à demanda.

Considerando a situação atual, durante uma pandemia os orçamentos governamentais deveriam ser modificados drasticamente, priorizando o investimento em teste, rastreamento, isolamento e capacitação de hospitais. Ele também deve reconhecer que o sistema de saúde público deve ser racionado, ajudando os cidadãos a tomarem decisões informadas sobre como agir.

Permitir que profissionais da saúde não sejam obrigados a trabalhar nestas condições também é um aspecto importante. Eles devem ter o poder de decidir quantos pacientes atender e em que condições, pois suas vidas também importam e não podemos considerá-los como servos da saúde pública.

A Suécia é um exemplo de país que reconhece, através de suas leis, a incapacidade do governo de implementar o confinamento obrigatório em grandes territórios. Desde o começo da pandemia, o país manteve lojas e restaurantes abertos, mas a vida está longe da normalidade. O distanciamento social e outras medidas de prevenção seguem sendo praticadas voluntariamente. Porém, os cidadãos continuam livres para pensar e agir.

Em nenhum momento o governo fingiu existirem poucos casos da doença e que as coisas “ficariam bem”. Contudo, não sendo possível testar todas as pessoas, suas leis reconhecem que algumas áreas podem ser fechadas, mas não cidades inteiras. (Swedish Communicable Diseases Act (2004: p. 168).

  • NA PRÁTICA, SE O GOVERNO NÃO TIVESSE O PODER DE IMPLEMENTAR O CONFINAMENTO OBRIGATÓRIO, A RESPOSTA PARA A PROPAGAÇÃO DESCONTROLADA DO SARS-CoV-2 TERIA SIDO MUITO MELHOR.

Se o governo tivesse claro quais eram suas responsabilidades através da lei, suas ações teriam sido focadas e efetivas.

Um maior esforço teria sido utilizado para o contínuo teste e isolamento de pessoas infectadas. Pois assim como é inválido o argumento de que a polícia não deve prender o criminoso que é capaz de detectar pois não é possível fazer o mesmo com todos os outros, as autoridades não podem parar de testar e isolar as pessoas detectadas pois não são capazes de fazer isso com toda a população.

Da mesma maneira, a lei seria capaz de prevenir a tentativa do governo de salvar todos os hospitais através do confinamento obrigatório de regiões inteiras. Seria muito provável que mais especialistas da saúde fossem consultados a fim de priorizar as áreas de foco da doença.

Finalmente, sendo incapaz de implementar o confinamento obrigatório, o governo teria muitas outras razões para identificar e eliminar regulamentações que previnam a ação rápida de organizações privadas e indivíduos, como por exemplo na produção de remédios, máscaras e álcool gel.

Ninguém é capaz de prever o que pessoas livres irão fazer com sua liberdade, mas uma lição que esse país tem demonstrado amplamente é que tanto indivíduos quanto empresas se provarão adaptáveis e inovadores. E isso aconteceria mesmo sem o confinamento obrigatório.

Muitas organizações privadas possuem incentivos para investir em pesquisa, teste e desenvolvimento de soluções para que continuem trabalhando mesmo durante a pandemia – por exemplo, na melhora de serviços online e a instalação de divisórias de plástico para que clientes e vendedores não infectem uns aos outros. Nesse aspecto, muitas empresas de tecnologia foram capazes de se desenvolver durante a pandemia pois foram deixadas livres para agir.

É verdade que mesmo com a ausência do confinamento obrigatório, muitas empresas teriam sofrido disrupções enormes, como empresas aéreas ou restaurantes. Mas essas disrupções seriam causadas pelas circunstâncias inerentes à pandemia e não criadas artificialmente.

Da mesma forma, se escolas privadas e pais tivessem sido livres para tomar suas próprias decisões, sua adaptação provavelmente teria sido melhor planejada, causando menos disrupção no ensino dos estudantes. Fatores como o nível de transmissão entre crianças e adultos, regiões de foco da doença e capacidade de adaptação tecnológica teriam sido consideradas em cada caso.

E assim como empresas e escolas, indivíduos também aprenderiam a se adaptar, sendo responsáveis por decidir a melhor maneira de agir e o impacto dessas considerações na sua vida como um todo. Por exemplo, existem muitas pessoas acima de 80 anos que preferem continuar convivendo com seus entes queridos e aproveitando os últimos anos das suas vidas, aceitando os riscos que a atual crise nos impõe.

  • O QUE VOCÊ PODE FAZER

Precisamos de leis que atuem com precisão cirúrgica sobre o objetivo desejado: remover ameaças ativas representadas por portadores de doenças infecciosas.

Em primeiro lugar, para que o governo possa fazer isso, as ações previstas em lei (teste, isolamento e rastreamento) devem ser claras, assim como sua capacidade do mesmo em investir nessas ações. Porém, isso não lhe dá o direito de controlar todos os aspectos do combate à ameaça, como proibir laboratórios de desenvolverem testes ou quem pode comprá-los.

Em segundo lugar, a lei deve retirar de governos federais e estaduais, o poder de implementar confinamentos obrigatórios, seja em Estados inteiros ou cidades, apenas em nome da saúde pública. O papel do governo federal não é o de preservar todas as vidas a qualquer custo, mas de proteger o direito individual de agir em busca da sua própria saúde como um aspecto da busca por sua própria felicidade.

O que precisamos, e o que pode ser feito realisticamente, é uma abordagem ao combate a doenças infecciosas que traduz na lei os melhores pontos implementados por Taiwan, Coréia do Sul e Suécia.

E como você pode fazer isso se tornar realidade?

Entre em contato com os seus representantes no governo. Comunique a sua visão sobre o objetivo da saúde pública diante da ameaça causada por uma doença infecciosa. Fale que tentar salvar a vida de todas as pessoas a qualquer custo ou colocar numa balança a vida de alguém em comparação com o ganha pão de outra pessoa não é um objetivo válido. Fale que além de testar, isolar e rastrear as pessoas, o governo deve comunicar informações claras e deixar as pessoas livres para agir. E fale que precisamos mudar nossas leis.

Se queremos que o nosso país continue livre, não podemos a outra crise de  SARS-CoV-2 ou outro novo vírus da mesma maneira que respondemos a essa crise. Existe uma maneira melhor de enfrentar a ameaça causada por doenças infecciosas, precisamos apenas transformá-la em lei.

__________________________________________

Revisado por Matheus Pacini.

Curta a nossa página no Facebook.

Inscreva-se em nosso canal no YouTube.

__________________________________________

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Inscreva-se na nossa Newsletter