Desde sempre me considerei uma pessoa racional, mas não sabia que era objetivista. Na busca por um relacionamento amoroso, percebi, desde cedo, que a pessoa deveria preencher alguns requisitos. Na época, não entendia que meus “requisitos” eram, na verdade, valores dos quais eu não abdicaria. Poucas concessões até eram toleráveis, mas o custo delas não poderia ser muito alto.
Hoje, após estudar a filosofia objetivista por algum tempo, reconheço que, já naquela época, estava certa ao “escolher” uma pessoa com quem me relacionar.
Ao ler A Nascente, já tinha achado estupenda a frase: “Para dizer ‘eu te amo’, é necessário antes saber dizer ‘eu’”; afinal, é em nome da nossa própria felicidade que precisamos da pessoa que amamos; e, para ter consciência disso, precisamos edificar e reconhecer o nosso próprio valor.
Posteriormente, estudando mais a fundo a filosofia de Ayn Rand, deparei, no livro The Romantic Manifesto, com algumas passagens sobre o amor e sobre a importância que (sim!) lhe é dada pelo Objetivismo.
“O amor é uma resposta a valores. Você se apaixona pelo sentido que alguém dá à sua vida, por sua postura frente à vida, por essa combinação fundamental que é a essência da personalidade. A pessoa se apaixona pela personificação dos valores que dão forma ao caráter do outro, refletidos em seus maiores êxitos ou em seus pequenos gestos, que criam o estilo de sua alma, o estilo individual de uma consciência única, irrepetível e insubstituível. É o próprio sentido de vida que seleciona, e que responde ao que reconhecemos como valores básicos do outro. Não se trata de uma questão de convicções declaradas (mesmo que estas não sejam irrelevantes), mas sim, se trata de muito mais, de uma harmonia muito mais profunda, consciente e subconsciente”.[1]
Hoje, entendo com muito mais clareza que o amor é uma escolha, um reconhecimento de valores no outro, uma admiração pela autoestima que vejo no outro. Afinal, respeito e admiração são fundamentais para o sucesso de um relacionamento. E não é possível desenvolver respeito e admiração por quem não tem valores claros de vida.
Nesse sentido, também é imprescindível nos relacionamentos amorosos usar a razão, já que é por meio dela que alcançamos o conhecimento humano. Segundo o Objetivismo, é por meio da razão que percebemos os fatos concretos. Assim, seguir a razão é agir de acordo com os fatos da realidade.
Por não serem ferramentas de cognição, as emoções não podem servir de guia. Elas estão presentes na nossa vida, mas devem ser mantidas no seu devido lugar. E esse lugar, segundo o Objetivismo, não é orientando a tomada de decisões do homem. Isso é trabalho da mente. E essa relação não pode ser invertida, sob pena da destruição do próprio homem.
Assim, um homem racional, mesmo que conviva com emoções, nunca se permitirá ser guiado por caprichos, mas tão somente por valores baseados em seu julgamento racional.
Seguir a razão, portanto, não é negar sentimentos.
As emoções podem servir de alerta no processo de pensar; mas elas, por si mesmas, não são capazes de fornecer as informações necessárias e essenciais para a tomada de decisões. Via de regra, elas nos apresentam respostas automáticas e superficiais. Sozinhas, respondem apenas a prazeres momentâneos. Por sua vez, as decisões exigem a identificação dos valores em jogo, o que reivindica uma atividade fundamentalmente racional.
Para Ayn Rand, uma das maiores maldades do misticismo é acreditar (e fazer acreditar) que o amor é uma questão do coração, e não da mente, ou que o amor é uma emoção que independe da razão.
Reconheço que é um grande desafio colocar a razão e as emoções em seus devidos lugares, de modo que convivam harmonicamente, o que permite a conquista da felicidade e viabiliza a descoberta do amor romântico verdadeiro. No entanto, uma vez encontrado esse equilíbrio, e dando prioridade à razão, as trocas conquistadas numa relação de amor romântico serão inestimáveis.
O amor não se trata de um tiro no escuro, do esquecimento/renúncia de todos os seus valores, muito menos abrir mão de quem somos. Ao contrário, o amor é o reconhecimento de todos os nossos valores no outro. Nas palavras de Ayn Rand: “quando o amor é uma integração consciente da razão e da emoção, da mente e dos valores, então, e somente então, é a maior recompensa na vida de um homem”.[2]
Eu soube escolher! E sou racionalmente muito feliz com o amor romântico que escolhi, por quem tenho grande admiração e em quem reconheço valores que me são muito caros.
O que se pode concluir a partir dessa análise é que a pergunta do título não deveria ser vista como um paradoxo ou como uma polêmica. Ao contrário, o que deveria ser preocupante é a utopia de um amor sem racionalidade.
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Revisado por Roberto Rachewsky e Matheus Pacini.
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[1] RM, Philosophy and Sense of Life” – tradução livre.
[2] RM, Philosophy and Sense of Life” – tradução livre.