Ayn Rand sobre arte e literatura

***Esse é um trecho da entrevista de Ayn Rand à revista Playboy. Ela está disponível na íntegra aqui***

PLAYBOY: em sua ênfase na razão, você está em conflito filosófico com escritores, romancistas e poetas contemporâneos – muitos dos quais se autodenominam místicos ou irracionalistas. Por que é assim?

RAND: Porque a arte tem uma base filosófica, e as tendências filosóficas dominantes atualmente são uma forma de neomisticismo. A arte é a projeção da visão fundamental que o artista tem do homem e da existência. Como a maioria dos artistas não desenvolve uma filosofia independente e própria, eles absorvem, consciente ou inconscientemente, as influências filosóficas dominantes de seu tempo. Grande parte da literatura atual é reflexo fiel da filosofia de hoje – e veja os resultados!

PLAYBOY: Mas não deve um escritor refletir o seu tempo?

RAND: Não. Um escritor deve ser um líder intelectual ativo de seu tempo, e não um seguidor passivo, escravo de uma corrente. Um escritor deve moldar os valores de sua cultura, deve projetar e concretizar os objetivos valiosos da vida do homem. Esta é a essência da escola romântica da literatura, que tem tudo, mas desapareceu da cena atual.

PLAYBOY: do ponto de vista literário, onde estamos?

RAND: No beco sem saída do Naturalismo. O Naturalismo sustenta que um escritor deve ser um fotógrafo passivo que deve transcrever acriticamente tudo o que por ventura observar ao seu redor. O Romantismo sustenta que um escritor deve apresentar as coisas não como elas são, em um ponto isolado no tempo, mas, citando Aristóteles, “como poderiam e devem ser.”

PLAYBOY: Você diria que você é a última dos românticos?

RAND: ou a primeira de seu retorno – para citar um dos meus próprios personagens em A Revolta de Atlas.

PLAYBOY: Qual é a sua avaliação da literatura contemporânea em geral?

RAND: Filosoficamente, imoral. Esteticamente, aborrece-me até a morte. Ela apodrece em um esgoto de depravação. E não há nada tão chato quanto a depravação.

PLAYBOY: Existem romancistas que você admira?

RAND: Sim. Victor Hugo.

PLAYBOY: E sobre romancistas modernos?

RAND: Não, não há ninguém que eu poderia dizer que admiro entre os escritores atuais. Eu prefiro a literatura popular de hoje, que é a remanescente atual do Romantismo. O meu favorito é o Mickey Spillane.

PLAYBOY: Por que você gosta dele?

RAND: Porque ele é essencialmente um moralista. Numa forma primitiva de romance policial, ele apresenta o conflito entre o bem e o mal, em termos preto e branco. Ele não apresenta uma mistura desagradável cinza de canalhas indistinguíveis dos dois lados. Ele apresenta um conflito intransigente. Como escritor, ele é brilhante especialista no aspecto da literatura que eu considero mais importante: estrutura do enredo.

PLAYBOY: O que você acha de Faulkner?

RAND: Não gosto muito. Ele é um bom estilista, mas praticamente ilegível em conteúdo – por isso, li muito pouco dele.

PLAYBOY: E sobre Nabokov?

RAND: Eu li apenas um livro e meio dele – o meio foi Lolita, que eu não consegui terminar. Ele é um estilista brilhante, escreve muito bem, mas sua disciplina, o seu sentido de vida e visão do homem é tão ruim que nenhuma habilidade artística pode justificá-las.

PLAYBOY: Como romancista, você considera a filosofia como o objetivo principal de sua escrita?

RAND: Não. Meu objetivo principal é a projeção de um homem ideal, do homem “como ele pode e deve ser.” Filosofia é o meio necessário para tal fim.

PLAYBOY: Em seu romance inicial, Cântico, seu protagonista declara: “é minha vontade que escolhe, e a escolha de minha vontade é o única lei que respeito.” Isso não seria anarquismo? Seria o desejo ou a vontade de alguém a única lei que este deve respeitar?

RAND: Não a própria vontade, mas sim o próprio julgamento racional. Isto é, mais ou menos, uma expressão poética deixada clara pelo contexto total da história da obra Cântico. Veja, eu uso o termo livre-arbítrio em um sentido totalmente diferente do que normalmente utilizado. Livre-arbítrio consiste na capacidade do homem de pensar ou não pensar. O ato de pensar é ato primário de escolha do homem. Um homem racional nunca será guiado por desejos ou caprichos, apenas por valores com base em seu julgamento racional. Essa é a única autoridade que ele pode reconhecer. Isso não significa anarquia, haja vista que, se um homem quer viver em uma sociedade livre, civilizada, ele deve, com razão, optar por observar as leis, sempre e quando forem objetivas, racionais e válidas. Eu escrevi um artigo sobre isso em A Virtude do Egoísmo – sobre a necessidade e função própria de um governo.

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Tradução de Roberto Rachewsky

Revisão de Matheus Pacini

Publicado originalmente por Playboy

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