A Revolta de Atlas é um livro poderoso porque mostra as consequências finais das crenças populares atuais. É uma história mais dramática do que a vivenciada pela maioria de nós diariamente, embora retrate a mesma batalha de ideias travada em nosso tempo. Podemos ver os mesmos erros e características nas pessoas com quem interagimos. Atualmente, estou relendo a obra pela quarta vez e, novamente, obtendo muito valor da experiência. Abaixo seguem as minhas citações favoritas da Parte II – Isso ou Aqui. Você pode ler minhas notas e comentários sobre a Parte I nesse link.
“Finalmente os pequenos têm o seu lugar ao sol”, disse o colunista. O sol, no caso, eram as chamas que devoravam as torres da Petróleo Wyatt. À luz desse sol, fizeram fortunas do tipo que sempre sonharam, das que não exigem competência nem esforço. Então seus principais clientes, como as companhias de energia elétrica, que consumiam óleo em quantidades imensas e não podiam ser compreensivos com as fraquezas humanas, começaram a converter suas instalações para o consumo de carvão – e os clientes menores, mais tolerantes, começaram a abrir falência. As autoridades em Washington impuseram o racionamento de petróleo e um imposto sobre os empregadores para sustentar os trabalhadores de petróleo desempregados. Então algumas grandes empresas de petróleo fecharam, e os pequenos, em seu lugar ao sol, constataram que uma broca que antes custava 100 dólares agora custava 500, pois não havia mais mercado para equipamentos de exploração petrolífera, e os fabricantes tinham de ganhar numa broca o que antes ganhavam em cinco, senão iriam à falência. E assim os oleodutos começaram a fechar, pois não havia ninguém que pudesse financiar sua manutenção. As ferrovias, portanto, receberam permissão de aumentar as tarifas de transporte de carga, pois havia pouco petróleo para transportar e o custo de manter vagões-pipas em circulação levara duas pequenas ferrovias a fechar. E, quando o sol se pôs, viram que os custos de operação, que antes lhes permitiam sobreviver com base em pequenos campos, só podiam ser mantidos com os campos imensos da Wyatt, que haviam se esvaído em fumaça. Foi só quando suas fortunas se evaporaram que os pequenos perceberam que nenhuma empresa no país podia agora pagar o preço que eles tinham que cobrar para cobrir os custos da extração do petróleo. Então as autoridades em Washington concederam subsídios aos donos de companhias de petróleo, mas nem todos eles tinham amigos em Washington, e se criou assim uma situação que ninguém fazia questão de examinar nem discutir detalhadamente.[1]
Ayn Rand faz um trabalho excepcional ao mostrar as consequências de eventos secundário em A Revolta de Atlas. Você vê isso no relato das consequências do incêndio na Petróleo Wyatt, bem como nas citações abaixo.
– Srta. Taggart, sabe o que caracteriza o medíocre? É o ressentimento dirigido às realizações dos outros. Essas mediocridades sensíveis que vivem tremendo de medo de que o trabalho de alguém se revele mais importante que o delas – não imaginam a solidão que se sente quando se atinge o cume. A solidão por não se conhecer um igual – uma inteligência que se possa respeitar, uma realização que se possa admirar. Os medíocres, escondidos em suas tocas, rangem os dentes para a senhorita, crentes de que a senhorita sente prazer em ofuscá-los com o seu brilho, e, no entanto, a senhorita daria um ano de sua vida para ver um simples lampejo de talento entre eles. Eles invejam a capacidade, e seu sonho de grandeza é um mundo em que todos os homens sejam reconhecidamente inferiores a eles. Eles não sabem que esse sonho é a prova cabal de sua mediocridade, porque esse mundo seria insuportável para o homem capaz. Eles não sabem o que o homem capaz sente quando está cercado de seres inferiores. Ódio? Não, não é ódio, mas tédio – um tédio terrível, sem esperanças, paralisante. De que adianta receber elogios e adulações de homens por quem não se sente respeito? Já sentiu vontade de ter alguém para admirar? Algo que a obrigasse a levantar a vista? Dr. Stadler para Dagny, falando do motor elétrico.[2]
A maioria das pessoas olha ao seu redor e se sente ameaçada pelo sucesso dos outros. Elas prefeririam estar em situação pior que estão desde que os outros não estivessem melhor que elas. Esse é o instinto que alimenta o temor da desigualdade que atormente tantas pessoas atualmente. Elas não admiram, mas temem o sucesso dos outros.
Rearden contemplou a beleza discreta e esculpida da sala e as pessoas sentadas às mesas. Tinham um ar de ostentação, como se suas roupas caríssimas e seus cuidados excessivos com a aparência não produzissem o efeito de esplendor desejado. Em seus rostos havia uma expressão de ansiedade rancorosa.
– Dagny, olhe para essa gente. São os playboys da vida, que vivem correndo atrás do prazer, que amam o luxo. Ficam parados, esperando que esse lugar lhes dê um significado, ao invés de eles próprios darem significado ao lugar. Mas eles são sempre apontados a nós como os apaixonados pelos prazeres materiais e depois nos dizem que desfrutar dos prazeres materiais é errado. Mas essa gente está desfrutando de alguma coisa? Estão tendo algum prazer? Não haverá algo de distorcido no que nos ensinam, algum erro terrível e muito importante?
– É, Hank. Terrível, mesmo, e importantíssimo.
– Eles são os playboys, ao passo que nós não passamos de comerciantes, eu e você. Você não vê que temos muito mais capacidade de desfrutar deste lugar que eles?
– É.[3]
Luxos precisam ser obtidos. Primeiro trabalhe, depois tire férias. Você deve conquistar o dinheiro para desfrutá-lo. É por que isso que os homens self-made são felizes, enquanto seus herdeiros, não. Esses têm o mesmo dinheiro que seus pais tinham e não entendem por que não são igualmente felizes. A explicação para tal é que eles não terem trabalhado para obtê-lo.
Você vê esse equívoco em grande escala com o sonho da Mega-Sena. As pessoas imaginam que a riqueza imerecida de um bilhete de loteria trará felicidade. Por certo, o prêmio resolverá seus problemas financeiros e, talvez, lhes trará algum respeito na sociedade. Mas todos saberão que é uma riqueza imerecida. O prêmio pode trazer satisfação momentânea, mas tudo não passa de uma ilusão: as pessoas que serão atraídas por você só o ajudarão a manter essa ilusão para se aproveitarem de você.
– Dagny, por que é que a maioria das mulheres não admitiria isso, mas você admite?
– Porque elas nunca têm certeza de que é bom ser querida. Eu tenho.
– Eu admiro a autoconfiança.
– A autoconfiança é apenas uma parte daquilo a que me referi, Hank.
– E o que é o todo?
– Confiança em relação ao meu valor… e ao seu. – Rearden olhou para ela como se houvesse captado um pensamento súbito, e ela acrescentou, rindo: – Eu jamais teria certeza de possuir um homem como Orren Boyle, por exemplo. Ele não ia me querer. Mas você me quer.
– Está dizendo – perguntou ele, lentamente – que subi no seu conceito quando você descobriu que eu a queria?
– É claro.
– Não é essa a reação da maioria das pessoas quando descobrem que são desejadas.
– Não é.
– A maioria das pessoas sobe em seu próprio conceito quando veem que são queridas.
– Pois eu acho que os outros se valorizam quando me querem. E é isso que você acha a respeito de si mesmo também, Hank, mesmo que não admita que é. – Dagny sobre o porquê ela gosta de homens que gostam dela.[4]
Uma hora depois, sua tentativa de sorrir já havia se transformado numa súplica impotente. Depois o sorriso desapareceu, à medida que ela olhava para as pessoas ao seu redor. Viu que aquelas moças elegantes e cheias de si se dirigiam a Jim com uma insolência antipática, como se não tivessem o menor respeito por ele. Uma delas em particular, uma tal de Betty Pope, filha da anfitriã, a toda hora fazia comentários dirigidos a Jim que Cherryl não conseguia entender, porque não acreditava que significassem aquilo mesmo que ela pensava.[5]
Essa é uma citação das cenas que relatam o relacionamento de Jim e Cherryl. Mas essa parte “Cherryl não conseguia entender, porque não acreditava que significassem aquilo mesmo que ela pensava”, se destaca. A frase que experimentamos como “Não, não pode ser isso.” Às vezes, a sua opinião sobre outras pessoas pode estar errada ou, talvez, ser falsa. Às vezes, todavia, o pior é verdade. É importante confiar em seu julgamento e aprender como diferenciar as duas.
– Quero que você saiba uma coisa – disse Cherryl, com uma voz tensa e áspera –, para que não haja fingimento nenhum. Não vou bancar a cunhadinha simpática. Sei o que você fez com Jim, sei como você tem causado sofrimentos a ele toda a vida. Eu vou protegê-lo de você. Vou colocá-la no seu lugar. Eu sou a Sra. Taggart. Agora a mulher da família sou eu.[6]
O discurso do dinheiro de Francisco D’ Anconia
Você pode ler o discurso completo aqui; vale a pena lê-lo em sua totalidade. Abaixo seguem minhas citações favoritas.
– Então o senhor acha que o dinheiro é a origem de todo o mal? O senhor já se perguntou qual é a origem do dinheiro? Ele é um instrumento de troca, que só pode existir quando há bens produzidos e homens capazes de produzi-los. O dinheiro é a forma material do princípio de que os homens que querem negociar uns com os outros precisam trocar um valor por outro. O dinheiro não é o instrumento dos pidões, que recorrem às lágrimas para pedir produtos, nem dos saqueadores, que os levam à força. O dinheiro só se torna possível por intermédio dos homens que produzem. É isso que o senhor considera mau?
O dinheiro exige que o senhor venda não a sua fraqueza à estupidez humana, mas o seu talento à razão humana. Exige que compre não o pior que os outros oferecem, mas o melhor que ele pode comprar. E, quando os homens vivem do comércio – com a razão e não à força, como árbitro ao qual não se pode mais apelar –, é o melhor produto que sai vencendo, o melhor desempenho, o homem de melhor juízo e maior capacidade – e o grau da produtividade de um homem é o grau de sua recompensa.
Mas o dinheiro é só um instrumento. Ele pode levá-lo aonde o senhor quiser, mas não pode substituir o motorista do carro. Ele lhe dá meios de satisfazer seus desejos, mas não lhe cria desejos. O dinheiro é o flagelo dos homens que tentam inverter a lei da causalidade – aqueles que tentam substituir a mente pelo sequestro dos produtos da mente. O dinheiro não compra felicidade para o homem que não sabe o que quer, não lhe dá um código de valores se ele não tem conhecimento a respeito de valores, e não lhe dá um objetivo se ele não escolhe uma meta. O dinheiro não compra inteligência para o estúpido, nem admiração para o covarde, nem respeito para o incompetente. O homem que tenta comprar o cérebro de quem lhe é superior para servi-lo, usando dinheiro para substituir seu juízo, termina vítima dos que lhe são inferiores. Os homens inteligentes o abandonam, mas os trapaceiros e vigaristas correm a ele, atraídos por uma lei que ele não descobriu: o homem não pode ser menor do que o dinheiro que ele possui. É por isso que o senhor considera o dinheiro mau? Só o homem que não precisa da fortuna herdada merece herdá-la – aquele que faria sua fortuna de qualquer modo, mesmo sem herança. Se um herdeiro está à altura de sua herança, ela o serve; caso contrário, ela o destrói. Mas o senhor diz que o dinheiro o corrompeu. Foi mesmo? Ou foi o herdeiro que corrompeu seu dinheiro? Não inveje um herdeiro que não vale nada: a riqueza dele não é sua, e o senhor não teria tirado melhor proveito dela. Não pense que ela deveria ser distribuída – criar 50 parasitas em lugar de um só não reaviva a virtude morta que criou a fortuna. O dinheiro é um poder vivo que morre quando se afasta de sua origem. Ele não serve à mente que não está a sua altura. É por isso que o senhor o considera mau?
Amar uma coisa é conhecer e amar sua natureza. Amar o dinheiro é conhecer e amar o fato de que ele é criado pela melhor força que há dentro do senhor, sua chave mestra que lhe permite trocar seu esforço pelo dos melhores homens que há. O homem que venderia a própria alma por um tostão é o que mais alto brada que odeia o dinheiro – e ele tem bons motivos para odiá-lo. Os que amam o dinheiro estão dispostos a trabalhar para ganhá-lo. Eles sabem que são capazes de merecê-lo.[7]
As pessoas que odeiam o dinheiro ou desejam um sistema em que não tenham que trabalhar para obtê-lo são as pessoas que não acreditam que merecem o dinheiro e não querem fazer o trabalho necessário para se tornar bom o bastante para merecê-lo.
Então o senhor verá a ascensão daqueles que vivem uma vida dupla, que vivem da força, mas dependem dos que vivem do comércio para criar o valor do dinheiro que saqueiam. Esses homens vivem pegando carona com a virtude. Numa sociedade em que há moral, eles são os criminosos, e as leis são feitas para proteger os cidadãos contra eles. Mas, quando uma sociedade cria uma categoria de criminosos legítimos e saqueadores legais – homens que usam a força para se apossar da riqueza de vítimas desarmadas –, então o dinheiro se transforma no vingador daqueles que o criaram. Tais saqueadores acham que não há perigo em roubar homens indefesos, depois que aprovam uma lei que os desarme. Mas o produto de seu saque acaba atraindo outros saqueadores, que os saqueiam como eles fizeram com os homens desarmados. E assim a coisa continua, vencendo sempre não o que produz mais, mas aquele que é mais implacável em sua brutalidade. Quando o padrão é a força, o assassino vence o batedor de carteiras. E então essa sociedade desaparece, em meio a ruínas e matanças.[8]
Existe um momento posterior no livro quando Lilian e Jim relembram a época anterior ao surgimento de novos vigaristas como Cuffy Meigs. Eles preferiam fingir que eram nobres, mas se sentem inferiores aos vigaristas porque esses não precisam manter as aparência. Eles não percebem que estão em um jogo em que a violência dá as cartas.
Hank, não quero nada de você senão o que quer me dar. Lembra que uma vez você me chamou de comerciante? Quero que você só procure seu próprio prazer em mim. Se você quer continuar casado, sejam quais forem os motivos, não tenho o direito de me ressentir disso. O comércio que prático é saber que a felicidade que você me dá é paga pela felicidade que você encontra em mim – não pelo seu sofrimento nem pelo meu. Não aceito sacrifícios nem os faço. Se você me pedisse mais do que o que você representa para mim, eu recusaria. Se me pedisse que largasse a estrada de ferro, eu largaria você. Se o prazer de um tem que ser pago pelo sofrimento do outro, então é melhor que não haja comércio nenhum. Uma transação comercial na qual um sai lucrando e o outro sai perdendo é uma fraude. Você não faz isso no seu trabalho, Hank. Não o faça na sua vida.[9]
Esse é um conselho de vida simples, porém provocador. A maioria das pessoas se assusta com a visão de relacionamento como troca mutuamente benéfica. Em um relacionamento, a maioria das pessoas não quer assumir a responsabilidade de ser de valor para o parceiro.
Recuso-me a aceitar como crime minha própria existência e o fato de eu ter que trabalhar para meu sustento. Recuso-me a me sentir culpado porque trabalho melhor do que a maioria das pessoas – porque meu trabalho vale mais do que o de meus semelhantes e mais pessoas estão dispostas a me pagar. Recuso-me a pedir desculpa por ser mais capaz – não aceito pedir desculpa por ter tido sucesso –, me recuso a pedir desculpas por ter dinheiro. Se isso é mau, aproveitem. Se é isso que o público considera prejudicial a seus interesses, então que me destrua. É esse o meu código de valores – e não aceito outro.
– Lembra o que lhe disse a respeito do dinheiro e dos homens que tentam inverter a lei da causalidade? Os que tentam substituir a mente apossando-se dos produtos dela? Pois o homem que sente desprezo por si mesmo tenta obter amor-próprio por meio de aventuras sexuais – o que é inútil, porque o sexo não é a causa, e sim o efeito e uma manifestação da imagem que um homem faz do próprio valor.[10]
Atraso de apenas um dia, mas atrasou em três dias o trem de carga no 386, que ia da Califórnia para Nova York com 59 vagões cheios de alface e laranjas. O trem esperou em desvios, em estações, pelo combustível que não vinha. Quando, por fim, chegou a Nova York, todo o carregamento teve de ser despejado no rio East: havia esperado demais nos armazéns da Califórnia, com a redução dos trens em circulação e com a proibição de que uma locomotiva puxasse mais de 60 vagões de uma vez. Somente os amigos e os sócios perceberam que três plantadores de laranjas na Califórnia declararam falência, bem como dois plantadores de alface em Imperial Valley. Ninguém ligou para a falência de uma corretora em Nova York, de uma empresa de encanamentos a quem a corretora devia dinheiro, de um atacadista que havia vendido canos à empresa de encanamentos. Quando havia gente passando fome, afirmavam os jornais, não se devia ficar preocupado com a falência de empresas que só visavam ao lucro. O carvão enviado pelo Departamento de Ajuda Internacional jamais chegou à República Popular da Inglaterra: foi roubado por Ragnar Danneskjöld.
Na segunda vez em que a Carvão Danagger atrasou a entrega de combustível para a Taggart Transcontinental, em meados de janeiro, o primo de Danagger gritou irritado, ao telefone, que não fora sua culpa: suas minas haviam permanecido fechadas por três dias, em consequência da falta de óleo lubrificante para as máquinas. A entrega de carvão foi atrasada por quatro dias.
O Sr. Quinn, da Companhia Quinn de Rolamentos, que se mudara de Connecticut para o Colorado, esperou uma semana pelo trem cargueiro que trazia seu carregamento de aço da Rearden. Quando o trem chegou, as portas da fábrica estavam fechadas.[11]
Como a citação anterior da Petróleo Wyatt, esses são dois grandes exemplos na história do poder das consequências não intencionais. O bem e o mal tem um grande efeito cascata.
Olhe ao seu redor – disse ele. – Uma cidade é a forma concretizada da coragem humana – a coragem dos homens que pensaram pela primeira vez em cada parafuso, cada rebite, cada gerador necessário para construí-la. A coragem de dizer não “a meu ver”, mas “o fato é o seguinte”, e apostar sua própria vida no seu julgamento. Você não está sozinha. Esses homens existem. Eles sempre existiram. Houve um tempo em que os seres humanos se acocoravam em cavernas, à mercê de todas as pestes e tempestades. Será que homens como os membros da sua diretoria teriam sido capazes de tirá-los das cavernas e fazê-los chegar até isso? – Apontou para a cidade.[12]
O acidente de trem
O capítulo que detalha o acidente de trem no estado do Colorado é provavelmente o capítulo mais impactante do livro. Vale a pena lê-lo, pois mostra um exemplo claro de como evitar a responsabilidade, e como a evadir-se de pensar leva a tragédias. Essa é a Alemanha Nazista. Isso é o que você vê quando você visita países socialistas.
Viu, horrorizado, que agora precisava optar entre as vidas de seus filhos e as dos passageiros do Cometa. Um conflito como esse jamais ocorrera antes. Era por proteger a segurança de seus passageiros que ele antes podia dar segurança a seus filhos; servia tanto àqueles quanto a estes igualmente, sem conflito de interesses, sem que ninguém tivesse que ser vítima. Agora, para salvar os passageiros, ele teria que sacrificar seus filhos.”[13]
Quando você aceita pequenos equívocos diariamente, você acaba com escolhas como essa.
A responsabilidade que James Taggart e Clifton Locey não haviam assumido agora recaía sobre os ombros de um rapaz trêmulo e confuso. Ele hesitou, mas ganhou coragem ao dizer a si próprio que não se podia duvidar da boa-fé e da competência daqueles que administravam a ferrovia. Não sabia que sua concepção dos executivos da ferrovia era do século anterior. Com a precisão conscienciosa de um ferroviário, no momento em que completou meia hora de espera ele assinou seu nome na ordem de que o Cometa deveria seguir viagem com a locomotiva número 306 e transmitiu a ordem à estação de Winston. – Essa ordem foi dada pelo último funcionário que tinha sobrado após todos os outros terem pedido demissão.[14]
Dizem que as catástrofes são frutos do acaso, e haveria quem dissesse que os passageiros do Cometa não eram culpados nem responsáveis pelo que aconteceu com eles.
O homem da suíte A, vagão n…1, era um professor de sociologia que ensinava que a capacidade individual é irrelevante, que o esforço individual é fútil, que a consciência individual é um luxo supérfluo, que não há mente, caráter ou realização individual, que tudo é realizado pela coletividade e que o importante são as massas, não os homens.
O homem da cabine 7, vagão n…2, era um jornalista que escrevia que era correto e moralmente justificável usar a coação “por uma boa causa”, que se via no direito de desencadear a força bruta sobre os outros – destruir vidas, sufocar ambições, estrangular desejos, violar convicções, prender, roubar, assassinar – em nome de tudo o que ele considerasse uma “boa causa”, que nem precisava ser uma ideia, já que nunca definira o que chamava de bom, porém apenas dizia que era guiado por “um sentimento” – um sentimento fora do controle do conhecimento, pois ele achava a emoção superior ao conhecimento e se baseava apenas em suas “boas intenções” e na força das armas.
A mulher da cabine 10, vagão n… 3, era uma professora idosa que passara a vida ensinando sucessivas turmas de crianças indefesas a serem covardes, ensinando-lhes que a vontade da maioria é o único padrão do que é bom e do que é mau, que a maioria pode fazer o que bem entender, que ninguém deve afirmar sua personalidade, e sim agir como os outros agem.
O homem da suíte B, vagão n… 4, era um editor de jornal que acreditava que o homem é mau por natureza e incapaz de ser livre; que seus instintos básicos, se não forem controlados, o levam a mentir, roubar e assassinar – e que, portanto, ele tem que ser controlado por meio de mentiras, roubos e assassinatos, que devem ser privilégio dos governantes, no sentido de obrigar os homens a trabalhar, ensinar-lhes a serem corretos e mantê-los dentro dos limites da ordem e da justiça.
O homem da suíte H, vagão n… 5, era um empresário que adquirira uma mina com auxílio de um empréstimo do governo, concedido pela Lei da Igualdade de Oportunidades.
O homem da suíte A, vagão n… 6, era um financista que fizera fortuna comprando debêntures ferroviárias “congeladas” e depois pedindo que seus amigos em Washington as “descongelassem”.
O homem da poltrona 5, vagão n… 7, era um trabalhador que achava que tinha “direito” a um emprego, independentemente da vontade do empregador.
A mulher da cabine 6, vagão n… 8, era uma conferencista que achava que, como consumidora, tinha “direito” a transporte, independentemente da vontade da companhia ferroviária.
O homem da cabine 2, vagão n…9, era um professor de economia que defendia a abolição da propriedade privada, argumentando que a inteligência não desempenha nenhum papel na produção industrial, que a mente do homem é condicionada por instrumentos materiais, que qualquer um pode administrar uma fábrica ou uma ferrovia, bastando para tal se apossar das máquinas.
A mulher da suíte D, vagão n… 10, era uma mãe que colocara os dois filhos para dormir no leito acima do seu, cobrindo-os cuidadosamente para protegê-los das correntes de ar e das sacudidelas do trem. Seu marido tinha um emprego público que consistia em garantir o cumprimento dos decretos. Ela o defendia dizendo: “Não faz mal, porque só os ricos são prejudicados. Afinal, tenho que pensar nos meus filhos.”
O homem da cabine 3, vagão n… 11, era um neurótico desprezível que escrevia peças de teatro idiotas cuja mensagem social eram pequenas obscenidades covardes que davam a entender que todos os empresários eram canalhas.
A mulher da cabine 9, vagão n…12, era uma dona de casa que achava que tinha o direito de eleger políticos sobre os quais nada sabia para cargos que lhes permitiam controlar indústrias gigantescas cuja existência ela ignorava.
O homem da suíte F, vagão n…13, era um advogado que certa vez dissera: “Eu dou um jeito de me adaptar a qualquer sistema político.”
O homem da suíte A, vagão n…14, era um professor de filosofia que ensinava que não existia inteligência – como é que você sabe que o túnel é perigoso? –, nem realidade – como é que você pode provar que o túnel existe? –, nem lógica – por que você afirma que os trens só podem andar se puxados por uma locomotiva? –, nem princípios – por que aceitar as restrições impostas pela lei de causalidade? –, nem direitos – por que não obrigar as pessoas a ficarem em seus empregos à força? –, nem moral – o que há de moralmente elevado em administrar uma ferrovia? –, nem absolutos – que diferença faz viver ou morrer, afinal? Ele ensinava que não sabemos nada – por que se opor às ordens dos superiores? –, que jamais podemos ter certeza de nada – como é que você sabe que está com a razão? –, que temos que agir conforme as exigências do momento – você não quer se arriscar a perder o emprego, não é?
O homem da suíte B, vagão n…15, herdara uma fortuna e vivia dizendo: “Por que só Rearden deve ter permissão de fabricar o metal Rearden?”
O homem da suíte A, vagão n…16, era um humanitário que certa vez dissera: “Os homens capazes? Não me importa que sofram. Eles têm de ser castigados para que os incompetentes possam viver. Francamente, não me importa se isso é justo ou não. Orgulho-me de não fazer justiça aos capazes, quando o que está em questão é a piedade para com os necessitados.”
Esses passageiros estavam acordados, e não havia ninguém em todo o trem que não compartilhasse com eles ao menos uma ideia. Quando o trem entrou no túnel, a chama da Tocha de Wyatt foi a última coisa que eles viram no mundo…[15]
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Publicado originalmente em Ryan Ferguson Blog.
Traduzido por Matheus Pacini.
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[1] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 19-20.
[2] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 28-29.
[3] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 42-43.
[4] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 46.
[5] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 57.
[6] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 68.
[7] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 83-87.
[8] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 88.
[9] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 99-100.
[10] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 157.
[11] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 174-175.
[12] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 190.
[13] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 280.
[14] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 285.
[15] RAND, Ayn. A Revolta de Atlas. Trad. de Paulo Henriques Britto. Rio de Janeiro: Sextante, 2010. V. II, p. 287-289.