Liberdade de Expressão, Propriedade e o direito de discriminar

Ainda nesse ano, a Suprema Corte americana irá emitir seu veredicto com respeito ao caso Masterpiece Cakeshop v. Colorado Civil Rights Commission. O assunto em pauta é se o proprietário de uma padaria deve ser obrigado a preparar um bolo para um casal gay, violando assim suas crenças religiosas. A real questão em jogo é: uma empresa tem o direito de discriminar com base nos valores pessoais de seu proprietário? Em outras palavras, proprietários têm o direito de exercer seu próprio julgamento ao fazer negócios?

Em essência, esse caso diz respeito às liberdades de crença e expressão garantidas pela Primeira Emenda e, em vista dela, se devemos aceitar dois pesos e duas medidas; se devemos aceitar que alguns pontos de vista – geralmente, de esquerda – sejam considerados aceitáveis enquanto outros – basicamente de qualquer outra fonte – não o sejam.

Recordei-me dessa caso quando participei de um painel sobre liberdade de expressão promovido pelo grupo UC Berkeley College Republicans e patrocinado pelo Ayn Rand Institute (ARI). O painel contava com Steve Simpson (ARI) e Heather Mac Donald (Manhattan Institute) – com moderação de Dave Rubin, do Rubin Report. Os participantes discutiram uma gama de assuntos relacionados à liberdade de expressão: contudo, o ponto mais interessante foi levantado por Simpson, que tratava da relação entre propriedade privada e liberdade de expressão. Ele argumentou que o direito de livre expressão de um indivíduo acaba onde inicia o direito de propriedade do outro, ou seja, o direito à liberdade de expressão de X é absoluto em sua propriedade (ou em uma propriedade pública), mas não em qualquer outro lugar.

Quando analisados por esse prisma, grupos como Antifa e Occupy Wall Street violam direitos individuais ao invadir a propriedade de terceiros sob a bandeira da “liberdade de expressão”. Da mesma forma, empresas como Google têm o direito de demitir um funcionário como James Damore por expressar visões contrárias aos seus valores corporativos. (Damore processou o Google sob a acusação de discriminação contra conservadores, etc).

Na faculdade, passei por uma situação semelhante a de Damore quando me candidatei a um estágio em uma pequena empresa de marketing em Brookline, Massachusetts. No dia da entrevista, fui recebido pela administradora para discutir o meu currículo. Quando ela viu que eu havia estagiado na campanha republicana para o governo de meu estado, ela disse: “não creio que possamos contratar um republicano”, disse ela. Fiquei surpreso – chocado até – e não sabia o que dizer além de “tudo bem, obrigado”. Apertamos as mãos e saí do local. No dia seguinte, fui aceito noutra empresa para uma vaga semelhante.

Essa experiência me mostrou duas coisas: (a) um empregador deve discriminar ao contratar funcionários potenciais – normalmente, por competência, aptidão e afinidade com a função; mas, além disso, (b) entendi que ela tinha o direito de me discriminar por qualquer razão. Talvez, não tenha gostado de meu terno, da minha faculdade, ou, até mesmo, não teve uma boa primeira impressão sobre mim; talvez, não tenha gostado da cor da minha pele, de minha etnia ou de minhas ideias. Embora eu – e qualquer pessoa com autoestima – preferisse ser julgado com base em critérios objetivos como competência, aptidão e afins, não neguei o direito dela de tomar decisões com base em outros critérios – até mesmo, critérios políticos. No fim das contas, a empresa era dela, a vaga estava sendo oferecida por ela e a propriedade era dela – não minha.

Isso leva ao segundo ponto desse episódio: emprego é uma via de mão dupla. Por que eu trabalharia para uma administradora que descarta um candidato a vaga de emprego sem considerar sua competência, aptidão ou capacidade na função? Eu não agiria assim.

Eu também não compraria um bolo de casamento de alguém que crê que não tenho o direito de casar por ser gay. De fato, quando eu e meu marido nos casamos, entrevistamos o quadro de funcionários do hotel, os fotógrafos, os DJs e as floristas para ter certeza de que estávamos trabalhando com pessoas que estavam felizes de fechar negócio conosco.

Por sinal, a única discriminação que enfrentamos foi por parte do governo federal que atrasou nosso casamento. No momento em que a seção três do DOMA (Defense of Mariage Act, ou Ato em Defesa do Matrimônio, em português) foi declarado inconstitucional em 2013, meu marido e eu já estávamos namorando há mais de seis anos. Antes disso, diversos estados já reconheciam o casamento gay, mas queríamos assinar um contrato matrimonial que fosse reconhecido como qualquer casamento heterossexual em todos os cinquenta estados e pelo governo federal. Tivemos que esperar por mais dois anos pela decisão da Suprema Corte, em 2015, do caso Obergefell v. Hodges. Pouco depois, e já com oito anos de namoro, anunciamos nosso noivado.

Os direitos dos gays, violados por tanto tempo pelo governo, não são violados quando um indivíduo ou uma empresa decide não fazer negócio conosco. Se quisermos ter liberdade de opinião, liberdade religiosa ou liberdade de pensamento, todos devem ter o direito de exercer suas crenças em sua própria propriedade ou negócio – ainda que isso signifique negar serviço a pessoas a cujo estilo de vida se opõem. Da mesma forma, indivíduos devem ser livres para escolher com quais empresas irão se relacionar como clientes ou empregados – e pelas mesmas razões.

Por mais retrógrada que seja sua visão religiosa, o padeiro da Masterpiece Cakeshop ainda tem o direito de exercê-la – e de negar serviço a potenciais consumidores que a contradiga. Por mais intolerantes que sejam suas visões políticas, os executivos da Google têm o direito de se posicionar de acordo com elas – e de negar emprego a pessoas que as contradigam. O mesmo vale para a empresa em Brookline que se recusou a me contratar – e para qualquer empresa, em qualquer lugar.

Infelizmente, não é assim que os esquerdistas veem as coisas. Eles querem ter o seu bolo e, ao mesmo tempo, comê-lo. Eles adotam dois pesos e duas medidas, visando criar uma situação em que apenas esquerdistas (por exemplo, a administração do Google) possam exercer seu direito à expressão e à liberdade, enquanto que aqueles com visões conservadoras e libertárias, por exemplo, sejam não apenas silenciados, mas também forçados a usar sua propriedade da forma que a esquerda julga adequada. Isso é uma perversão dos direitos garantidos pela Primeira Emenda, bem como uma violação dos direitos de propriedade.

O governo dos Estados Unidos, que corrigiu a injustiça histórica de negar aos gays seu direito de casar, não deveria cometer uma nova injustiça ao negar o direito de os padeiros usarem sua liberdade da forma como julgarem adequada. Padeiros que tomarem decisões irracionais quanto ao uso de sua propriedade ou à escolha de clientes sofrerão consequências econômicas, assim como o Google, provavelmente, sofrerá consequências econômicas por discriminar irracionalmente contra conservadores. Ainda assim, nenhum dos lados deve sofrer nenhuma consequência política por exercer seu direito ao livre pensamento, à livre expressão e à propriedade privada.

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Publicado originalmente em The Objective Standard.

Traduzido por Bill Pedroso.

Revisado por Matheus Pacini.

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