Resenha da obra “A nascente”

Contém spoilers!

Ayn Rand, autor de diversas obras como A revolta de Atlas, A nascente, Cântico e A virtude do egoísmo, nasceu no início do século XX, em São Petersburgo, Rússia.

Rand estudou Filosofia e História na Rússia antes de conseguir autorização para deixar esse país e se mudar para os Estados Unidos em 1926, país que admirava como um modelo a ser seguido em razão da valorização que conferia à liberdade do indivíduo.

A presente obra começou a ser escrita em 1935, um ano antes da publicação de seu primeiro romance We the Living, sendo publicada dois anos antes do fim da II Guerra Mundial, em 1943.

A nascente é um dos livros mais conhecidos da autora e foi o que lhe projetou à fama, havendo inclusive uma adaptação cinematográfica do mesmo.

O conflito entre o indivíduo e o coletivismo retratado pela autora pode ser encontrado anteriormente em sua obra Cântico, que parece antecipar o tema central tratado por Rand em A nascente

Ao longo de suas centenas de páginas, Rand apresenta ao leitor as peculiaridades, características, modo de pensar e valores de cada um dos principais personagens de sua obra.

Logo no início, o leitor percebe que Howard Roark será o personagem principal do livro: Rand o apresenta como um exemplo da capacidade do exercício da razão, um indivíduo de inabalável convicção sobre seus valores, independentemente das pressões externas que possam incidir.

Mesmo quando a flexibilização de suas convicções possa representar um benefício concreto para Roark, como sua permanência e graduação no curso de Arquitetura, o personagem prefere arcar com as consequentes penas do que flexibilizar seus valores e aquilo que acredita ser o certo a fazer.

Nos primeiros capítulos da obra, Rand também apresenta um dos principais contrapontos a Roark, Peter Keating, um personagem que, ao contrário de Roark, possui “valores” maleáveis e não se importa com quais meios (sejam quais forem) precisa seguir para alcançar seu objetivo, sendo visto por terceiros como um homem de sucesso.

Para atingir tal objetivo, Keating mente, manipula, nega sua própria felicidade (ao preterir a mulher que ama e se casar com outra, quem lhe auxiliaria a atingir sua “meta”) e que, acidentalmente, até “mata”. Tudo isso para, ao final, ver-se infeliz, mesmo atingindo o fim que esperava.

Ao longo da obra, outro personagem essencial é apresentado, o símbolo das ideais coletivistas, da mediocridade e da ameaça às liberdades do indivíduo: Ellsworth Monkton Toohey.

Toohey é um personagem que conhece as suas limitações e que, portanto, também tem consciência de que a única forma de obter o poder que almeja é convencendo aqueles com quem se relaciona de que o medíocre deve ser valorizado acima da excelência, bem como que o indivíduo deve ser desconsiderado em prol do bem comum.

 Ellsworth representa os elementos capazes de contribuir para atrasar ou mesmo involuir o desenvolvimento humano. Ele é a trava que impede o movimento da engrenagem do progresso e que, se deixado ali por muito tempo, pode romper a “máquina” como um todo.

Toohey tem uma característica que o diferencia de outros personagens: enquanto alguns adotam as ideias coletivistas por genuinamente acreditarem que esta é a melhor forma de se viver (ou por se negarem a encarar a realidade), Ellsworth tem plena consciência de que sua narrativa e discurso não condizem com o que é melhor para aqueles a quem ele busca influenciar.

Outros dois personagens-chave do romance de Rand são Dominique e Gail Wynand. Tal qual Roark, Dominique detecta a inversão de valores que tomou conta da sociedade retratada por Rand. Isso a torna perdida e desesperançosa com o futuro, e ela passa só a “existir” e não “viver”.

Isso muda quando conhece Roark e encontra alguém que compartilha seus valores fazendo com que, pela primeira vez, sinta-se atraída por um indivíduo. O primeiro encontro dos dois é descrito pela própria personagem como uma violação.

Um dos pontos, sem dúvida, mais polêmicos e de difícil compreensão do livro, talvez reflexo da época em que foi escrito e do imaginário que existia (e que foi retratado em outras obras literárias e cinematográficas da época), em torno de um amor que precisava ser “tomado” para se concretizar.

É uma cena que causa espanto e parece incompreensível para os leitores da obra nos dias atuais. Contudo, Roark e Dominique são retratados como apaixonados desde as primeiras interações e formam o principal par romântico do livro.

Já Gail Wynand, quem foi casado com Dominique, é apresentado como alguém com valores similares aos de Roark, o que lhe rende admiração da própria Dominique. No entanto, Wynand escolhe, conscientemente, flexibilizar esses valores para formar e gerir seu império midiático. Quando conhece Roark e tenta mudar, já é tarde demais. Ele se sente incapaz e isso o destrói por dentro. Por fim, a visão de Roark torna-se para ele uma mistura de admiração e de uma constante lembrança do homem que ele poderia ter sido, mas não foi.

O livro termina com uma vitória de Roark sobre as ideais coletivistas reinantes. Mas, ao fim da leitura, uma ideia não sai da cabeça do leitor: será que fora da ficção criada por Rand, o desfecho descrito para Roark se materializaria?

A obra e cada um dos personagens principais representam os valores e elementos que compõem a filosofia proposta por Rand e as principais ideais opostas a ela.

Por fim, talvez um trecho do discurso de Roark que resuma a ideia de Rand seria o seguinte: “Eu não reconheço nenhuma obrigação para com os outros homens, com uma única exceção: respeitar a sua liberdade e não participar de nenhuma maneira em uma sociedade escravocrata”.

André Hemerly Paris
Sócio-administrador da Fakos – consultoria de Compliance e Privacidade de Dados, professor e autor do livro “Compliance – Ética e Transparência como Caminho” (traduzido para a língua inglesa sob o título: “Ethics & Transparency – A Path to Compliance”).

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Revisado por Matheus Pacini.

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