Uma abordagem moral sobre a pandemia

Indivíduos não têm direito de iniciar qualquer ação que coloque em risco a integridade física dos demais – seja pela força, fraude ou carregamento de material tóxico ou vírus letal. No caso de uma pandemia, é papel do governo segregar os virulentos, como costuma fazer com os violentos. Para isso, ele precisa identificar quem é violento, quem é virulento e quem é inocente, pois, se há a necessidade de conter os agressores, também existe a de proteger os inocentes, que não podem ser tratados como aqueles.

No caso de uma pandemia, os inocentes, até que a polícia identifique quaisquer culpados, são aqueles que não ameaçam a saúde alheia, seja porque já estão imunes ou ainda não foram infectados. Logo, é inaceitável uma quarentena horizontal, pois tratamos os inocentes como se fossem agressores potenciais. É como se acontecesse um crime aqui na minha rua e todos os moradores da vizinhança fossem presos até que a identificação do culpado. Liberdade é ausência de coerção. Ninguém usa a sua liberdade contra a integridade alheia. Para agredir terceiros, lançamos mão da coerção, e esta deve ser combatida.

Pessoas incapazes de transmitir um vírus não podem ser tratadas como se fossem bandidos só por estarem usufruindo seus direitos individuais inalienáveis. Como nem o governo, nem a sociedade podem ficar passivos permitindo que a consequência nefasta de um ato agressivo inexorável se consuma, devemos evitar que as vítimas mais vulneráveis sejam afetadas, poupando a todos das graves consequências, Sim, porque se não podemos identificar e segregar os agressores, então, devemos identificar e proteger as vítimas em potencial para que sejam colocadas em isolamento preventivo até que o perigo passe.

Farei uma analogia e espero que não me entendam mal. Na Alemanha de Hitler, as relações sociais deixaram de se alicerçar na confiança recíproca para se basearem no medo. Com seu comportamento virulento, os nazistas não podiam ser contidos e agiam incontinentes para agredir seus alvos. O que as pessoas faziam para proteger aqueles que seriam caçados e mortos por eles? Escondiam judeus, ciganos, gays e outras minorias em sótãos ou porões para que os nazistas não tivessem contato com eles. Então, assim como o governo não pode suspender o princípio da presunção de inocência quando ocorre um crime, também não pode quando ocorre uma epidemia.

Assim como a governo não identifica e prende todos os criminosos, fazendo com que a mortandade inevitável continue, ceifando vidas às dezenas de milhares, não vai conseguir detectar boa parte dos indivíduos que portam vírus agredindo as pessoas de forma involuntária e inconsciente. E por que essa abordagem seletiva é moral? Porque as pessoas são donas das suas vidas e não podem ser proibidas de vivê-las, fazendo as escolhas que quiserem, a não ser que estejam concretamente ameaçando a integridade física de terceiros. Ética ou moral é o ramo da filosofia que trata do padrão de valor mais adequado para a vida de um ser humano.

Nesse caso, o maior padrão de valor para o indivíduo é a sua própria vida e felicidade. Cabe-lhe, portanto, agir com liberdade para criar, manter ou dispor dos valores que entende necessários para satisfazer seus propósitos de vida, sem que isso implique impor sacrifícios concretos para os outros, nem para si mesmo. Por outro lado, as pessoas podem estar se perguntando: mas se não for o governo, quem vai ajudar as pessoas e empresas em momentos de crise como esse que estamos vivendo?

Ora, sabemos que, para superar problemas econômicos, é preciso continuar criando riqueza e, se isso não for possível, devemos usar aquilo que acumulamos ao longo do tempo de forma a prevenir imprevistos como esses. Pandemias, como diz o economista Nassim Taleb, não são cisnes negros, ou seja, não são eventos que fogem totalmente do nosso conhecimento ou de previsões potenciais. Pandemias, tal qual terremotos, inundações ou incêndios são ocorrências que fazem parte das nossas vidas porque são imposições da natureza da qual fazemos parte. Governos não criam riqueza e não são propriamente prudentes em lidar com o dinheiro alheio. Via de regra, a hierarquia de suas preferências colide com os interesses dos indivíduos que ele, governo, acaba explorando com o uso pervertido da coerção que lhe é outorgado pela sociedade como monopólio para extirpar a violência das relações sociais.

Da mesma forma que indivíduos e empresas contratam seguros ou formam fundos para enfrentar contingências desastrosas, o mercado financeiro, previdenciário ou securitário tem as ferramentas para cobrir perdas eventuais com sinistros como o súbito fechamento de empresas, desemprego, rompimento de contratos ou elevação extraordinária de gastos com doenças, hospitalização e medicamentos. Se o mercado fosse livre e houvesse estímulo para que os particulares poupassem, investissem, inovassem, produzissem e oferecessem bens e serviços para satisfazer as necessidades e as demandas do público, somando-se a isso ainda a caridade feita por particulares, veríamos que os governos têm dois papéis fundamentais em épocas de crise ou fora delas: proteger os indivíduos de quem pode agredi-los e sair da frente da livre iniciativa, dando-lhe espaço necessário para criar riqueza para enfrentar as dificuldades da vida.

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Revisado por Matheus Pacini.

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