Três mitos sobre a liberdade de expressão ou: como (NÃO) defender a liberdade de expressão

Passei grande parte dos últimos 20 anos defendendo a liberdade de expressão. Primeiro, como advogado em Direito Constitucional e, hoje, como palestrante e escritor do Ayn Rand Institute (ARI). Estou convencido de que a liberdade de expressão está sob ataque nos Estados Unidos; todavia, a maior ameaça não são os “flocos de neve” ou, até mesmo, os estudantes violentos nos campi – mas sim o fato de que poucas pessoas entendem o significado desse direito, incluindo muitos que desejam defendê-lo. Aqui seguem três argumentos falhos em defesa da liberdade de expressão.

1. Liberdade de expressão é um valor “social”.

O argumento mais comum em prol do direito à liberdade de expressão é que ela é necessária para o autogoverno. O argumento: se as pessoas não tiverem acesso à informação, não poderão tomar as decisões necessárias para defender uma sociedade livre.

É verdade que, para que possamos nos autogovernar, devemos estar informados. Mas esse argumento tem um defeito fatal: se a liberdade de expressão é só um meio para o autogoverno, então, não deveríamos censurar a expressão de ideias perigosas? Esse é, exatamente, o argumento em prol da censura das redes sociais.

As fake news (notícias falsas) estão por todos os lados. As redes sociais ameaçam a “democracia” ao “semear a divisão e a discórdia.” Não importa o que você pensa dessa visão, não existe escassez de ideias ruins que destruiriam a liberdade se fossem adotadas. Racismo e comunismo são as primeiras que vêm à mente. Existem milhares de outras. O governo deveria censurá-las?

Não. Mas não pela razão de a liberdade de expressão facilitar o autogoverno. A liberdade de expressão não é apenas um meio para um fim social mais amplo: ela é um direito individual essencial. Para viver e prosperar, devemos adquirir conhecimento e fazer escolhas. Devemos ser livres para pensar: lidar com fatos, seguir nosso julgamento e tirar nossas próprias conclusões.

Do mesmo modo, devemos ser livres para falar com os outros: aprender, ensinar e compartilhar informações. A liberdade de expressão e a liberdade de pensamento andam de mãos dadas. A censura é um esforço para restringi-las. As pessoas acham que controlar o discurso necessariamente restringirá a disseminação de ideias ruins. Mas não funcionará. Isso é destrutivo e imoral.

“E, no entanto, ela se move” – disse Galileu após ter sido forçado a negar sua tese de que a Terra girava em torno do Sol. Você não pode nem mesmo forçar as pessoas a adotar ideias verdadeiras. Uma arma não introduzirá as respostas certas em sua cabeça durante uma prova de matemática.

Sim, as pessoas podem e, às vezes, adotam ideias terríveis. Contudo, para sermos capazes de defender as melhores ideias, devemos proteger a liberdade de expressão, bem como a liberdade de pensamento. Tentar forças as pessoas a aceitar as suas ideias apenas estimula resistência em alguns, e passividade mental em outros. Em nenhum dos casos, o resultado final é uma sociedade livre.

2. Liberdade de expressão requer “tolerância”.

Não deveríamos forçar as pessoas a aceitar a verdade. Mas, então, isso significa que deveríamos “tolerar” todas as ideias? Claro que não! Considere a resposta comum quando alguém pede que alguns representantes de “minorias” devem “tolerar” supremacistas brancos.

“Sério? Deveria sentar e ouvir um cara que acha que eu não tenho o direito de existir?”

Eles estão certos: algumas ideias são erradas e imorais. Só não é verdade que devemos nos envolver com, ou ouvir os idiotas que as defendem. Tampouco significa, é claro que deveríamos atacar fisicamente aqueles com quem discordamos. É essencial que o governo permaneça neutro na batalha das ideias. No entanto, o resto de nós não é obrigado a adotar a mesma posição do governo. Existe uma terceira via entre tolerar todas as ideias e atacar, vaiar ou prender palestrantes de quem você não gosta.

Pense. Julgue. Fale. Seja seletivo em suas ideias. E, mais importante: recuse-se a apoiar ideias malignas e aqueles que as defendem. A liberdade de expressão não implica a obrigação de oferecer aos outros um fórum ou uma audiência. Significa, apenas, que temos de deixá-los livres para falar. A liberdade de expressão é essencial porque permite às pessoas discordar e cada qual seguir o seu caminho.

Mas se levamos ideias a sério, devemos estar preparados para julgá-las como boas ou más, agindo de acordo. Dentro disso, está o compromisso de se recusar a defender ideias com as quais discordamos.

3. Paus e pedras podem quebrar meus ossos, mas ofensas nunca podem me machucar.

Sua mãe estava certa. Ofensas (palavrões) não podem lhe machucar; e, tampouco, ideias.

Contudo, é um erro aceitar isso como a razão principal para proteger a liberdade de expressão, pois isso implica que ideias e palavras são impotentes, e tão só ações têm influência. Mas isso não é verdade. Ideais motivam ações. Os melhores eventos na história – e os piores – foram produto de ideias. A fundação dos EUA, a Revolução Industrial e a abolição da escravidão, por exemplo, foram motivadas por ideias. O mesmo se aplica ao comunismo, ao fascismo, à escravidão e a muitos outros episódios trágicos da história.

Quando nos apegamos tão só ao argumento de que palavras não podem nos machucar, caímos num dilema: por um lado, discurso é importante e deve permanecer livre. Porém, se o discurso não tem impacto no mundo, por que se incomodar em protegê-lo?

A verdade é que o discurso e as ideias transmitidas são muito importantes, mas ambos podem levar a resultados terríveis. Protegemos o discurso que transmite ideias ruins não porque ideias ruins em si não podem nos prejudicar, mas porque proteger a liberdade de expressão significa protege-la por princípio.

Deveríamos combater ideias ruins. Mas devemos fazê-lo investigando, aprendendo, argumentando e mostrando que outras ideias são melhores. Uma dessas ideias melhores é a liberdade de expressão. Mas ela só funcionará, de fato, se a entendermos corretamente.

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Publicado originalmente em Merion West.

Traduzido por Matheus Pacini.

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