O espírito benevolente de Bob Esponja

O nome Stephen Hillenburg pode não ser muito conhecido, mas a esponja amarela que ele criou faz muitos lembrarem a admiração infantil, a risada despreocupada e a paz de espírito características da infância. Hillenburg foi o criador de um dos desenhos animados mais icônicos e bem-sucedidos de todos os tempos: Bob Esponja.

Nascido em Lawton, Oklahoma, foi criado em Anaheim, Califórnia. Ali, desenvolveu um fascínio pelo mar e a vida marinha. Cresceu assistindo a filmes do oceanógrafo francês Jacques Cousteau, quem Hillenburg diz ter lhe apresentado uma “nova forma de ver o mundo”. Por horas a fio, explorava as várias “poças” que a maré formava, voltando para casa com diversas criaturas como estrelas-do-mar, caranguejos, mexilhões, cracas e ouriços-do-mar — que depois desenhava. Em 1977, Hillenburg participou da International Tournée of Animation, onde assistiu The Killing of an Egg, do animador holandês Paul Driessen. Segundo ele, o filme foi “peculiar de uma forma única e não conseguia tirá-lo da cabeça”[1], levando-o a pensar mais seriamente sobre como ele poderia utilizar a animação para dar vida às suas ideias.

Durante o ensino médio, Hillenburg continuou aprofundando seu interesse tanto pela vida marítima como pela arte e, então, decidiu fazer a faculdade em Biologia Marinha (com alguns créditos em Arte) na Humboldt State University. Por dois anos logo após formado, lecionou biologia marinha no Marine Institute de Orange County. Nesses dois anos, Hillenburg escreveu e ilustrou uma história em quadrinhos chamada The Intertidal Zone, com o objetivo de educar seus estudantes sobre a diversidade animal em poças de maré. Esse foi o começo do que viria a ser a sua criação mais famosa.

Buscando desenvolver suas habilidades em animação, Hillenburg ingressou no Califórnia Institute for the Arts, onde criou dois pequenos filmes: The Green Beret, a estória de uma escoteira deformada com mãos enormes que derrubava casas e destruía vizinhanças inteiras tentando vender biscoitos de porta em porta[2], e Wormholes, que demonstrava os efeitos da relatividade geral sobre a percepção, desde a perspectiva de uma mosca[3]. Wormholes foi exibido em diversos festivais de animação, incluindo o Ottawa International Animation Festival, onde ganhou o prêmio de melhor conceito.

Após assistir ao filme, Joe Murray, criador e diretor de A Vida Moderna de Rocko, contratou Hillenburg para dirigir a quarta e última temporada do show — seu primeiro emprego em animação. Murray lembra:

“O trabalho dele no desenho foi impecável. Nunca me esquecerei das várias noite em claro, trabalhando juntos nos detalhes de cada episódio, ou de ele chorando de rir quando rodava a gravação de alguém arrotando palavras, que pretendia usar num episódio. Era óbvio que alguém o contrataria rapidamente se eu não tivesse tido a sorte de contratá-lo antes. Lembro-me de um executivo da Nickelodeon se perguntando se ele servia para a televisão. Ele não servia. Ele era perfeito para um novo tipo de televisão. Sempre tentando algo novo, intenso e diferente. Ele era apaixonado, brilhante e incansável.”[4]

Com sua confiança renovada por seu trabalho em A Vida Moderna de Rocko, e motivado por seu amigo Martin Olson, roteirista do desenho, Hillenburg apresentou sua ideia de animação para um grupo de executivos da Nickelodeon. Segundo Eric Coleman, vice-presidente de desenvolvimento e produção de animações, Hillenburg foi “muito, muito além”. Na apresentação, ele e o artista Derek Drymon montaram um terrário que continha uma maquete do que viria a ser a “Fenda do Biquíni”, o cenário de Bob Esponja. Dentro dela, havia miniaturas de cada uma das personagens. Além disso, Hillenburg e Drymon vestiram roupas havaianas, e tocaram música havaiana em ukeleles – enquanto descreviam em verso e prosa a premissa do episódio-piloto e as personalidades e motivações de cada uma das personagens. Dizem que muitos executivos tiveram que deixar a sala para se recomporem. Em poucos minutos, a produção de Bob Esponja foi autorizada.[5]

A estória de Bob Esponja foca em uma esponja de cozinha otimista e alegre, que adora aventuras e se mete em várias enrascadas com seus amigos, que incluem o seu caracol de estimação, Gary; uma estrela-do-mar rosa burra, mas bondosa, Patrick Estrela; um polvo arrogante e mau-humorado, Lula Molusco; uma esquilo atlética e inteligente, Sandy Bochechas; um caranguejo avarento, Sr. Sirigueijo; um plâncton invejoso de um olho só, Plankton; e uma baiacu ansiosa, Srta. Puff.

Apesar dos desafios que Bob Esponja encara e do pessimismo de alguns personagens, ele adota um senso de vida[6] benevolente. Ele é curioso e se empolga com as aventuras que cada novo dia promete, respondendo sempre com a sua frase icônica, “Estou pronto! Estou pronto!”. Ele é apaixonado por seu trabalho como chapeiro de uma lancheira de fast-food, e aproveita a companhia de seus amigos. Cada episódio mostra uma narrativa que combina comédia pastelão com humor sutil, lembrando-nos de adotar uma atitude mais leve para com a vida. A séria reafirma a importância de olhar para o mundo com a imaginação de uma criança – sem medos ou inibições.

Talvez isso, mais que qualquer outra coisa, tenha sido o motivo de seu sucesso. O show e seu elenco foram amplamente elogiados pela crítica, e receberam diversos prêmios, que incluem seis Annies, três prêmios da ASCAP, quatro Emmys, quinze prêmios Kid’s Choice da Nickelodeon, entre outros. Bob Esponja se tornou o quinto show mais duradouro da história da televisão norte-americana, com doze temporadas e 251 episódios, indo ao ar em mais de duzentos países. A série também deu origem a dois filmes de longa-metragem (com um terceiro confirmado para maio de 2020). Até 2017, seu lucro já passava 13 bilhões de dólares com a venda de produtos.[7]

Tudo isso evidencia o poder da imaginação de Stephen Hillenburg.

Infelizmente, em março de 2017, Hillenburg revelou que tinha sido diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrópica (ELA), uma doença neurodegenerativa terminal. Faleceu de infarto em sua casa em 26 de novembro de 2018, aos 57 sete anos de idade. Os amigos e a família de Hillenburg o descrevem como alguém “tímido e muito reservado”. No entanto, seu legado de entusiasmo juvenil e otimismo exuberante continua conosco. Em suas criações, infundiu grande energia, alegrando milhões de telespectadores. Até hoje, inspira aqueles de coração puro como ele.

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Publicado originalmente em The Objective Standard.

Traduzido por Bill Pedroso.

Revisado por Matheus Pacini.

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[1] Magami, “Paul Driessen — Killing of An Egg”, YouTube, 5 de Julho de 2007.

[2] Selfademus, “Green Beret by Stephen Hillenburg”, YouTube, 26 de Maio de 2009.

[3] Nick Smith, “Stephen Hillenburg — Wormholes”, YouTube, 8 de Fevereiro de 2019.

[4] Joe Murray, “Rocko’s Modern Life Creator: Stephen Hillenburg ‘Changed the Face of TV Forever” 27 de Novembro de 2018.

[5] Karl Smallwood, “The Story of How SpongeBob SquarePants Made It to Air”, 4 de Dezembro de 2015.

[6] Nota do Tradutor: Ayn Rand define o “senso de vida” como o equivalente emocional da metafísica do indivíduo. Da mesma forma que a metafísica trata dos aspectos mais fundamentais da existência, e está na base de todos os conceitos do indivíduo, as valorações metafísicas primordiais do indivíduo definem a natureza das suas respostas emocionais. As crenças subconscientes do indivíduo em relação à natureza do universo, da consciência, e do seu papel no mundo são a essência do seu caráter, e dão origem a uma base emocional a partir da qual ele sente emoções específicas em situações particulares. De forma mais concreta, um indivíduo com um senso de vida racional e benevolente, como o promovido pelo Objetivismo, considera o homem como um ser capaz em um universo que permite a felicidade. Esse indivíduo sentirá, de forma geral, emoções boas, e terá respostas mais otimistas à maioria das situações. Alguém que adota os valores cristãos, por outro lado, e acredita viver em uma realidade essencialmente falha, sendo constantemente observado e julgado por alguém pode puni-lo por toda a eternidade, tem uma base emocional fundamentalmente diferente, e é consideravelmente mais propício a emoções como a culpa e a vergonha.

[7] Jack Fennimore, “Stephen Hillenburg Net Worth: Five Fast Facts You Need To Know” Atualizado em 28 de Novembro de 2018.

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