O erro cognitivo de Igualdade 7-2521

O conhecimento não é obtido de forma automática. Para adquiri-lo, é preciso agir: isto é, conhecimento exige ação. É só pensando que o indivíduo pode integrar percepções em conceitos. Ser capaz de pensar racionalmente não é algo conquistado do dia para noite: requer muito esforço e determinação constante. Em Cântico, Igualdade 7-2521 precisa ter um compromisso total com a verdade para descobrir a palavra “Eu”. Ele não pode evadir a realidade em nenhuma circunstância. Para tal, deve identificar a única fonte adequada para conhecimento, além da raiz da moralidade dos membros de sua sociedade.

O propósito central de Igualdade é entender a realidade. Queria ser um cientista para entender o mundo natural, porém isso lhe foi negado. Em vez disso, o Conselho das Vocações o obrigou a ser varredor de rua. Isso não o impediu, todavia, de buscar seu objetivo. Quando descobre o túnel, um local onde pode estar sozinho e pensar, decide manter essa descoberta em segredo. Durante o processo, comete diversos crimes como roubar velas e outros objetos, escrever em papel sem autorização, com vistas a cumprir seu objetivo principal: pensar, isto é, conhecer.

É com a descoberta do túnel que o valor central de Igualdade fica evidente, em contraste direto ao de Internacional 4-8818. Apesar de ele ser amigo de Igualdade e partilhar algumas semelhanças intelectuais, Internacional não tem um compromisso total com a verdade. O primeiro sentimento dele ao ver o túnel é de medo e, por isso, deseja contar sobre essa descoberta aos seus irmãos na Cidade. Isto é, Internacional toma uma decisão consciente de evadir a realidade. Mesmo com a oportunidade de buscar novos conhecimentos que poderiam levá-lo a um conjunto de ideias completamente novas, decide manter-se fora disto.

Por outro lado, Igualdade já tinha compreendido que havia coisas que os Eruditos não sabiam, e isso o motiva a buscar mais conhecimento. Já percebeu que o conhecimento não tem validação na autoridade, haja vista seu desrespeito a muitas leis da sua sociedade. Já notou que é preciso desafiar a autoridade e violar algumas leis para poder explorar novos lugares e adquirir conhecimento. Apenas aqueles que têm compromisso total com a razão podem adquirir conhecimento, já que isso não ocorre de forma automática.

Apesar de Igualdade escrever seus próprios pensamentos, explorar coisas novas e tentar desenvolver novas tecnologias, ainda se sente culpado. Ainda não entendeu que a moralidade é uma arma que os Eruditos usam contra todos os membros de sua sociedade. Assim, quando pensa sobre as coisas que tem feito, sente-se culpado. Esta culpa imerecida lhe causa um grande tormento mental, já que não considera exatamente o que está fazendo como errado. Porém, se sente culpado porque aceitou, sem questionar, a moralidade da sua sociedade. É esse sentimento de culpa que o converte em um prisioneiro dos outros homens.

A razão pela qual Igualdade quer oferecer sua invenção aos Eruditos é que tem esperança de que, se o fizer, poderá trabalhar com eles para desenvolver ainda mais a tecnologia, beneficiando a sociedade como um todo. Porém, não entende o que motiva os outros membros de sua sociedade. É ingênuo ao pensar que, por sua motivação ser obter conhecimento e ajudar os demais, deve ser essa também a motivação dos outros. Mas não é assim. O valor central dos Eruditos é poder: querem governar os outros através do uso da força. Neste momento da história, Igualdade ainda não compreende a maldade moral dos Eruditos.

Em uma sociedade moralmente corrupta, Igualdade é capturado e corre o risco de ser torturado. É devido ao seu compromisso total com a realidade que escolhe não mentir. É um momento crucial da história. Em sua concepção da realidade, só se pode dizer a verdade. Mesmo torturado por 30 dias, decide não mentir. Nesta sociedade, onde todos são fracos e sem autoestima, qualquer coisa que dissesse seria tomado como verdade. Ele poderia ter usado a moralidade coletivista de sua sociedade para conquistar o poder para si próprio, algo que certamente lhe renderia muitos privilégios. Igualdade, porém, não faz isso. Não é do seu interesse obter poder sobre os demais. O seu interesse é o seu próprio trabalho.

Quando Igualdade mostra a sua invenção e conta suas descobertas aos Eruditos, eles o condenam à prisão por seus “crimes”. Igualdade não se importava com o que fosse acontecer com seu corpo e sua mente: preocupava-se apenas com sua invenção. É apenas quando os Eruditos dizem que irão destruí-la que ele se dá conta de que os Eruditos não estão realmente interessados em conhecer e ajudar os outros, mas apenas em controlar. Novamente, Igualdade decide agir frente a uma situação difícil. Ele não aceita a sentença dos Eruditos sobre si próprio e sua criação. Toma uma decisão consciente de fugir da sociedade coletivista em que foi educado.

Quando consegue escapar para o bosque, ele se liberta do controle moral da sua sociedade. É neste momento da história que Igualdade começa a questionar as ideias da sua cultura. Ele se dá conta que violou muitas leis, mas que nunca tinha duvidado de sua validade. Agora que pode estar apenas com a pessoa com quem escolheu estar, Excelente, pode começar a pensar mais profundamente. Quando disse que está aprendendo a duvidar de sua cultura anterior, está falando da moralidade da cultura. Igualdade entende que, para identificar o que levou a sua sociedade a essas condições, deve pensar em princípios. E, então, começa a fazer perguntas fundamentais sobre a natureza do Bem e do Mal.

Para atingir o seu objetivo de entender a realidade, o seu compromisso para com ela deve ser absoluto. Não há negociação com princípios fundamentais. Assim, quando descobre a casa e encontra muitos objetos que não sabe utilizar, sua reação é tentar compreendê-los. Ele não foge com medo, mas aceita com curiosidade o que lhe é desconhecido. Exatamente o mesmo acontece quando descobre muitos livros novos, com muitas palavras das quais não sabe o significado. Igualdade decide que lerá os livros para compreender as ideias que contêm. A forma como reage a tudo está relacionada com o seu propósito central: compreender a realidade.

Só depois de um longo período de tempo dedicado a pensar, desde a primeira vez que começou a escrever até o momento da história onde já havia lido muitos livros, que, por fim, descobre a palavra “Eu”. Porém, Igualdade não apenas vê a palavra “Eu” e a insere em seu vocabulário. Ele vai além. O que fundamentalmente descobre é a ideia filosófica do Individualismo. Dado que já compreendeu que a realidade é o que é, que o meio para adquirir conhecimento é a razão, e que a sua sociedade anterior é moralmente malvada, pode agora compreender plenamente que a sua vida lhe pertence. Igualdade entende que a sua própria felicidade é a meta final da sua vida. Deseja que ninguém viva para ele, pois ele também não quer viver pelos outros. Entende que a forma correta para os homens interagirem entre si não é através de comando e obediência, mas através de acordos mútuos e voluntários.

Armado com esta nova filosofia, Igualdade busca libertar alguns dos outros indivíduos da sua antiga sociedade. Não quer libertar todos os membros da sociedade, pois isso é impossível: quer apenas explicar a sua nova filosofia individualista àqueles que queiram entendê-la. Aqui é onde o valor central dos outros personagens é relevante. Igualdade só quer convidar ao seu novo mundo aqueles que já identificou como pessoas de bom caráter moral, cujo propósito central é ser livre. Não pode obrigar os outros a virem com ele, nem quer obrigá-los a compreender as ideias que já compreendeu. Tudo o que Igualdade pode fazer é compartilhar os livros e as explicações de suas novas ideias. Porém, cada indivíduo deve tomar livremente a decisão de pensar.

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Revisado por Matheus Pacini.

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