‘Justiça Social’: a inimiga da verdadeira justiça

Justiça social! Por toda parte, ouvimos clamores por “justiça social” – de políticos, como Bernie Sanders, passando por intelectuais, como Noam Chomsky, clérigos, como o reverendo Jesse Jackson, até celebridades como Madonna. “Justiça social” virou o grito de guerra, o motivo, a justificação e o objetivo final de todas as políticas e plataformas da esquerda política. Com frequência, parece que o termo “justiça social” substituiu a própria palavra “justiça”. “Justiça social” é sinônimo de justiça? Seria ela uma forma “nova e melhorada” da boa e velha justiça? Ou, talvez, seja apenas a virtude da justiça aplicada à sociedade como um todo? Minha posição é de que a verdade é justamente o contrário: não apenas “justiça social” não é o mesmo que “justiça”, como aquela impossibilita a prática da verdadeira justiça.

Antes que possamos identificar o que é a “justiça social”, devemos perguntar: o que é a virtude da Justiça, e por que precisamos dela? O filósofo objetivista Leonard Peikoff define justiça como “a virtude de julgar objetivamente o caráter e a conduta do homem e agir de acordo, dando a cada homem aquilo que merece”. Por exemplo, em um tribunal (uma “corte de justiça”), esperamos que os juízes (nossos “julgadores”) ajam com justiça ao julgar objetivamente, ou seja, que embasem suas decisões exclusivamente na prova factual e considerem toda a evidência relevante. Sobre a necessidade de um conceito assim, a filósofa Ayn Rand escreve: “Que fato da realidade fez surgir o conceito de ‘justiça’? O fato de que o homem pode tirar conclusões sobre as coisas, pessoas e eventos ao seu redor, ou seja, deve julgá-las e avaliá-las”.

Para sobreviver, devemos julgar tudo; se certo alimento é seguro ou venenoso, se determinada linha de conduta é inteligente ou perigosa. A justiça é esse princípio de avaliação aplicado às ações que nós – ou os outros – escolhemos. O comportamento dessa pessoa favorece ou ameaça a vida? Com base nas evidências, ela é uma ameaça ou um benefício potencial? O princípio da justiça é o guia para fazer avaliações éticas, diz que você deve dar a cada indivíduo exatamente o que ele ou ela merece. Ao indivíduo moral, devemos respeito e admiração; já o indivíduo mau deve ser condenado, evitado ou coisa pior. O princípio de justiça é, claramente, uma necessidade profunda. Por exemplo, há uma diferença de vida ou morte em como alguém avalia e trata seu vizinho, dependendo se o vizinho é um gênio produtivo como Bill Gates ou um serial killer como Charles Manson.

São os indivíduos que pensam, escolhem e agem. Por isso, a “justiça” propriamente dita é, sobretudo, uma virtude a ser praticada por indivíduos. No entanto, como Yaron Brook aponta no livro Equal is Unfair, também podemos avaliar se um sistema social é justo ao analisar suas leis, instituições e governo, e verificando se trata os indivíduos como merecem ser tratados. Brooks escreve: “…um sistema de justiça social é um sistema livre, que respeita a dignidade individual ao proteger os direitos iguais de cada pessoa à vida, à liberdade e à busca da felicidade”. Em outras palavras, num sistema social adequado, cada indivíduo é igual politicamente, igual perante a lei e sujeito ao Estado de Direito.

É esse, então, o significado de “justiça social”? Bem, a ONU a define assim: “a justiça social pode ser entendida como a distribuição equitativa e solidária dos frutos do crescimento econômico”. E segue, dizendo, “…a justiça social não é possível sem políticas coerentes de redistribuição, concebidas e aplicadas por agentes públicos”. Atenção! Há duas ideias profundamente importantes (e profundamente perversas) contidas nesse conceito de justiça social. Essas ideias nefastas são fundamentais para o conceito de justiça social, mas conflitam totalmente com o princípio verdadeiro de justiça: (i) a ideia de igualdade econômica em vez da igualdade política perante a lei e (ii) a redistribuição coerciva necessária para atingir a igualdade econômica.

Primeiro, analisemos a ideia de “igualdade econômica”. É vital reconhecer que bens e serviços não existem na natureza. Não são “frutos” esperando colheita e distribuição “justa”. Não importa se falamos de carros, assistência médica, educação, moradia ou qualquer outra coisa: alguém deve criá-los ou fornecê-los. Assim, a questão mais básica na ciência econômica não é como distribuir “de forma justa” os bens que caem milagrosamente do céu, mas qual sistema social permite que bens e serviços sejam criados em primeiro lugar. A resposta seria: o sistema que permite que a mente de cada indivíduo funcione livremente, permitindo que gere valor. E o que seria um sistema de distribuição “justa”? Um sistema justo seria aquele que distingue entre o que é e o que não é merecido, permitindo que os indivíduos mantenham os valores que eles mesmos produzem (ou que negociem esses valores livremente), em que todos ganham sua “justa recompensa”, ou seja, o capitalismo.

Qual é o impacto existencial desse sistema? A evidência do sucesso do capitalismo quanto à geração de riqueza é esmagadora e inegável. Podemos olhar para qualquer gráfico do progresso humano nos últimos 150 anos e ver que, em um sistema de liberdade, o padrão de vida cresceu em ordens de grandeza (na maior parte, para os menos favorecidos), e a vida melhorou em todas as métricas: longevidade, mortalidade infantil, doença, fome etc. Infelizmente, essa prosperidade, o alívio da pobreza e todas as métricas do desenvolvimento humano não são as métricas ou as preocupações compartilhadas pelos defensores da justiça social. Seu foco não está na prosperidade, mas na igualdade. Resumindo a visão dos igualitaristas, o filósofo David E. Cooper escreve: “…onde a escolha é entre uma situação em que as vantagens de alguns não beneficiam o resto e uma situação em que não há vantagens a obter, o igualitarista deve preferir a última”.

Em outras palavras, pelos padrões da justiça social, o mundo seria um lugar melhor se todos fossem igualmente empobrecidos do que se houvesse desigualdade. John Rawls (um filósofo igualitarista muito influente), cujo livro Uma Teoria da Justiça lançou o movimento moderno de justiça social, falava com frequência sobre a riqueza como “valor social”, dizendo que a riqueza pertence à sociedade enquanto tal. No entanto, Ayn Rand frisou que a “sociedade”, num certo sentido, nem existe. “Sociedade” é apenas um conjunto de indivíduos que vivem juntos no mesmo país. Como pode, então, a riqueza – criada pelas escolhas, invenções, inovações, esforços e ações de indivíduos específicos – pertencer à sociedade como um todo? Justiça seja feita, não pode e não pertence.

Ainda assim, como demonstrado por suas prescrições de políticas públicas, os defensores da justiça social veem a riqueza como um bolo comunitário preexistente, só esperando para ser cortado “justamente” – para eles, o mesmo que igualitariamente. É aqui que entra a coerção. Como diz a definição de justiça social das Nações Unidas, seus proponentes pretendem usar “…políticas de redistribuição fortes e coerentes, concebidas e aplicadas por agentes públicos”. Assim, temos economistas como Thomas Piketty, defendendo taxas fiscais marginais de 80%, e políticos como Alexandria Ocasio-Cortez, pedindo a expansão maciça dos já exorbitantes programas de assistência social – todos meios para dividir o bolo (supostamente) estático, preexistente e limitado da riqueza “pública”.

Felizmente, em uma sociedade capitalista justa e livre, a riqueza é tudo, menos um bolo estático e limitado. Ao contrário, é um bolo que não para de crescer. No capitalismo, cada um pode assar o próprio bolo, e através de transações vantajosas com seus concidadãos, todos podem prosperar. No capitalismo, vivemos em um mundo justo, onde todos recebem sua justa recompensa. Quando a mente humana é libertada e os homens podem negociar livremente, o bolo não apenas cresce, mas se multiplica ad infinitum.

É importante tratar uma última questão. Pode haver, em uma sociedade, indivíduos que sofrem sem ter qualquer culpa disso, seja por acidente ou outra causa. A caridade com essas pessoas pode ser vista, de certa forma, como um ato de justiça. Estatisticamente, as sociedades mais livres e prósperas sempre foram, de longe, as mais caridosas. É apenas o fato de que essas sociedades são livres, justas e, portanto, prósperas, que lhes garante o excedente necessário para ajudar os mais vulneráveis.

Concluindo, vemos que a justiça real significa julgar cada indivíduo como indivíduo, e em um contexto social, significa proteger o direito de cada indivíduo ao que ele cria ou merece. Ignorando o fato de que são os indivíduos que escolhem pensar, agir e produzir (ou não), a “justiça social” é, em essência, uma tentativa de perverter a justiça, de fugir da distinção entre o que é conquistado e o que não é, o que é merecido e o que não é – tornando obsoleta a verdadeira justiça, a justiça real. Nada pode ser mais injusto.

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Traduzido por Matheus Pacini.

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