Heróis anônimos da pandemia: centistas

Quais times jogaram no último Super Bowl? Você sabe o nome de algum personagem dos filmes de Star Wars? Quem é o marido de Kim Kardashian? É provável que você tenha respondido corretamente a pelo menos uma dessas perguntas. Mas essas vão deixar você desconcertado: Quem criou o raio-X? Quem realizou o primeiro transplante de órgãos? Quem desenvolveu a vacina para varíola? Ou coqueluche? Ou sarampo?

É curioso que a maioria de nós saiba muito mais sobre esportes e cultura pop do que sobre os pioneiros da pesquisa científica. Mas os benefícios que todos colhemos de seu trabalho são incalculáveis, e é claro que nossa saída dessa pandemia global vai depender decisivamente do trabalho de cientistas para entender, rastrear e combater o novo coronavírus.

Uma história inspiradora do início da pandemia ficou na minha cabeça. A história da Dra. Helen Chu e seus colegas em Seattle é coisa de filme de suspense, mas aconteceu de verdade. Eles estão entre os heróis anônimos entre nós.

Chu e seus colegas estavam no meio de um estudo sobre gripe, em Seattle, quando souberam do primeiro caso americano confirmado de infecção por coronavírus, no estado de Washington. Eles perceberam rapidamente que poderiam ajudar a analisar a propagação do vírus. Para sua pesquisa sobre gripe, eles estavam coletando swabs nasais de pacientes na área de Puget Sound. Testando essas amostras novamente, eles poderiam descobrir até onde o novo coronavírus havia se espalhado.

Com uma velocidade incrível, eles conseguiram elaborar um novo teste. No entanto, por causa de regulamentações governamentais, não obtiveram aprovação para executá-lo. Eles fizeram, então, uma petição aos reguladores federais para obter aprovação. Dias, semanas se passaram. Quando conseguiram uma resposta, foi não.

Mas eles decidiram fazer o teste de qualquer maneira. Acontece que o vírus havia se estabelecido em solo americano sem ser detectado. Nas palavras da Dra. Chu: “Já está em todo lugar.”

Chu e seus colegas se viram em um dilema que podia acabar com suas carreiras: se divulgassem suas descobertas, entrariam em conflito com os reguladores; se retivessem suas descobertas, pessoas poderiam morrer. “Nos permitiram apenas que guardássemos para nós mesmos”, disse a Dra. Chu ao New York Times. “Mas o que sentimos que precisávamos fazer era contar à saúde pública.”

Eles concluíram que a coisa moralmente certa a fazer era compartilhar sua descoberta com as autoridades locais, e fizeram isso. Na manhã seguinte, as autoridades de saúde pública conseguiram identificar um adolescente infectado, com sintomas leves, enquanto ele caminhava para a escola.

Apesar de Chu e seus colegas terem revelado informações tão críticas, os reguladores mandaram parar com os testes. Lembre-se que tudo isso aconteceu enquanto os testes do próprio governo federal eram considerados defeituosos e a testagem em geral era severamente restrita, atrasando consideravelmente a testagem em larga escala necessária para o enfrentamento do vírus.

O que admiro na Dra. Chu e seus colegas não é apenas a engenhosidade em criar seu próprio teste, mas também sua corajosa disposição a desafiar obstáculos irracionais feitos pelo homem. A provação pela qual passaram apenas para compartilhar informações essenciais sobre o vírus é uma acusação contundente dos reguladores. É mérito de Chu e seus colegas que eles coloquem fatos e verdade acima de tudo, em nome de proteger a vida humana e aumentar nosso conhecimento sobre esse vírus.

Eles não estão sozinhos. Cientistas do mundo todo deixaram outros projetos de lado para se concentrar nesse vírus. Em uma escala inédita, eles estão cruzando fronteiras e fusos horários em colaboração para identificar as características desse vírus, seu comportamento dentro do corpo, sua disseminação dentro das comunidades, seu calcanhar de Aquiles, para que possa ser parado.

A corrida mundial para desenvolver uma vacina para o coronavírus é inspiradora. Para acelerar o processo, alguns projetos estão executando vários ensaios em paralelo, em vez de um após o outro. Dos mais de cem projetos de vacina em andamento, o do Instituto Jenner da Universidade de Oxford se destaca por seu tamanho. Esse esforço surgiu da pesquisa do Dr. Adrian Hill, diretor do Instituto Jenner. Graças, em parte, a uma aprovação emergencial do governo britânico, o projeto vai começar um teste com mais de seis mil pessoas em maio.

Resta saber se essa abordagem (ou uma das muitas em desenvolvimento) se mostrará eficaz e, se for, para qual perfil de paciente. Desenvolver vacinas é um processo lento, com baixa taxa de sucesso, na melhor das hipóteses. Mas é animador ver tantas mentes brilhantes focadas em combater o coronavírus com tanto vigor.

Quando ele finalmente for vencido, como vamos olhar para os cientistas que contribuíram para essa vitória?

No século passado, depois de desenvolver uma vacina para poliomielite, o Dr. Jonas Salk se tornou um nome familiar. Nova York ofereceu um desfile em carro aberto em sua homenagem. Mas ao receber esse amplo reconhecimento por sua realização científica, Salk se tornou um ponto fora da curva.

Vamos mudar isso. Será um sinal de progresso moral quando, em vez de negligenciá-los ou subestimá-los, apreciaremos plenamente os muitos heróis científicos desconhecidos desta pandemia.

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Publicado originalmente em New Ideal.

Traduzido por Matheus Pacini.

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