Existe alguma noção de dualismo no Objetivismo?

O dualismo, de acordo com Bk Sahni, a Wikipédia:

“Na Filosofia da Mente, o dualismo é uma visão sobre a relação entre mente e matéria que afirma que ambas constituem duas categorias ontologicamente separadas. O dualismo mente-corpo afirma que a mente e a matéria não podem ser reduzidas uma à outra de nenhuma forma. Tradições filosóficas dualistas ocidentais (exemplificadas por Descartes) equiparam a mente com o eu consciente, e teorizam sobre a consciência com base no dualismo mente/corpo. Comparativamente, algumas filosofias orientais traçam uma linha metafísica entre consciência e matéria, onde a matéria inclui corpo e mente.”

No Objetivismo, Ayn Rand promove a ideia de que nós, humanos, somos seres que integram mente e corpo. O Dr. Peikoff defende a ideia de que não há mente sem a consciência possibilitada pelo corpo – ou seja, que a consciência é (por certos meios) consciente de algo, e que os sentidos e o sistema nervoso são indispensáveis para estar consciente de qualquer coisa. Assim, embora o Objetivismo reconheça a existência da matéria e da consciência, não se trata de um dualismo como explicado no trecho acima.

No entanto, não acredito que tenhamos uma alma metafisicamente separável, no sentido contextual dos cristãos – não temos uma alma ou uma consciência que pode ser removida do corpo humano e depois colocada em algum tipo de recipiente. Não podemos ter um pote com consciência, outro com discernimento, outro com pensamento. Não temos absolutamente nenhuma evidência disso. Mas temos evidências de que somos conscientes da existência através de nossos sentidos, que podemos pensar sobre esse “conteúdo de consciência” e até mesmo ter livre arbítrio para fazer algo a respeito, seja mentalmente (pensando sobre as coisas) ou agindo no mundo (fazendo algo físico).

Estou começando a achar que a ideia de dualismo é uma espécie de falsa alternativa: nos pedem para escolher um ou outro ou ambos, em vez de uma abordagem diferente. Na época em que Ayn Rand escreveu seus artigos sobre mente e corpo, havia uma dicotomia mente/corpo histórica e culturalmente predominante devido ao cristianismo e a outros filósofos (Agostinho, [Tomás de] Aquino, Descartes, Kant, Hegel e Marx). Mas se somos seres que integram mente e corpo, então os dois só podem ser separados mentalmente, não sendo duas coisas metafisicamente diferentes que se fundiram. Assim como podemos isolar mentalmente nosso pé do resto do corpo, também podemos isolar mentalmente nosso pensamento, nosso sonho, nossa memória e nossa imaginação de qualquer coisa que façamos no reino físico, como correr, abrir uma porta, dirigir um carro e pegar uma sacola. Isso não implica que a consciência seja algo separável do corpo, apenas que podemos focar mentalmente na diferença entre, digamos, eu refletir mentalmente sobre um tema e digitar um texto utilizando o Microsoft Word.

Ainda não sabemos como surge a mente humana e, principalmente, como se forma o livre-arbítrio; não sabemos como a consciência nasce. Mas está claro que devemos ser entidades de um tipo específico para termos consciência e livre-arbítrio da forma como temos. Então, tem a ver com a forma como somos “feitos”, mesmo que ainda não saibamos os detalhes.

E, na verdade, já estou questionando o determinismo do “somos feitos de matéria, portanto, não podemos ter livre-arbítrio” de outro ponto de vista, pois creio que se baseia em uma consideração racionalista, baseada no seguinte silogismo: a matéria é determinista, o homem é feito de matéria; portanto, o homem é determinista – enquanto que, se olharmos para os fatos, sabemos o que somos com um grau muito alto de certeza. Somos feitos de matéria, e ainda assim, posso sentar aqui e pensar por vontade própria e escrever um ensaio sobre esse tema, mesmo que influências externas não guiem minha mente ou meus dedos. Cada um de nós é uma coisa, um ser vivo, e temos certas capacidades porque somos essa coisa, essa entidade, na realidade. E com nossa mente, podemos isolar certos aspectos de nós mesmos através de um processo de observação externa ou introspecção interior.

Então, se considerarmos essas questões a partir das premissas que proponho, várias questões filosóficas podem ser resolvidas. A dicotomia mente/corpo não acontece existencialmente, mas sim apenas mentalmente (se adotarmos as premissas erradas); somos seres vivos que têm certas capacidades por sermos quem somos. Quaisquer contradições que decorram dessas considerações só acontecem porque alguém lá nas profundezas da história isolou certas coisas mentalmente e pensou, erroneamente, que uma separação mental ou epistemológica é igual a uma separação metafísica, o que não é o caso. Não somos um espírito sem um corpo, nem um corpo sem uma mente. Não somos o fantasma na máquina – ao contrário, cada um de nós é uma entidade com certas habilidades e capacidades devido ao fato de sermos o que somos.

Um leitor perguntou, basicamente: Por que a consciência não é redutível à matéria, ou por que a consciência não pode emergir da matéria?

Depende muito de como você faz a pergunta. É possível que a vida tenha surgido da matéria inanimada e, eventualmente, tenha se tornado consciente da existência, tenha evoluído para ter autoconsciência, que tenha obtido o controle de seu bem-estar material através do aprendizado e tenha conquistado o controle de sua consciência para, finalmente, chegar à faculdade do livre-arbítrio? Tudo decorrente das leis do universo físico? Acho que é isso que você quer perguntar. Minha única resposta é que ainda não temos provas dessa sequência de eventos. Ninguém pegou matéria inanimada, transformou-a em algo vivo, depois adicionou mais matéria de um jeito específico para torná-la autoconsciente. E acho que ninguém sequer propôs uma teoria válida nesse sentido, embora a teoria da evolução seja um bom primeiro passo. Em síntese, ainda não temos a evidência ou a ciência de que seja possível fazer isso.

Mas mesmo que fosse, ainda há a questão filosófica de que consciência não é o mesmo que matéria. Como Peikoff aponta em seu breve podcast, há diferenças significativas entre a consciência como a experimentamos e o mundo material como o experimentamos. Afirma corretamente que a consciência parece não seguir as leis da física; nossas mentes não são atraídas pela gravidade, nem parecem flutuar soltas por aí como se estivessem em queda livre no espaço profundo. Em outras palavras, podemos pensar tão claramente aqui na Terra quanto na estação espacial, e nossas mentes provavelmente funcionariam bem em qualquer planeta ou situação de gravidade pesada que encontremos, desde que tenhamos fluxo sanguíneo adequado para nossos cérebros. Mesmo sob o efeito da grande aceleração durante o lançamento, até onde sei, os astronautas não sentem suas mentes sendo empurradas para a parte de trás da cabeça, não é? Nunca ouvi alguém relatar isso.

A conclusão é que a consciência como tal não é a mesma coisa que os sentidos materiais que a tornam possível; ver não é a mesma coisa que os olhos. Aristóteles destacou isso há mais de dois mil anos. Então, nesse sentido, a consciência não é redutível ao movimento das coisas físicas, embora possamos dizer que os movimentos das coisas materiais (ou seja, a sensação de toque decorrente de minha digitação no teclado) surgem por meio do físico, mas não são o mesmo que ele. Posso olhar para sua resposta, pensar sobre ela e responder a você, mas isso certamente não é a causalidade eficiente que parece dominar o mundo material. (Na verdade, discordo da causalidade eficiente como sendo a palavra final da causalidade, ou mesmo a compreensão mais fundamental da causalidade, mas essa é outra questão).

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Artigo publicado em Applied Philosophy Online.

Revisado por Matheus Pacini.

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