Por que os conservadores religiosos deveriam defender direitos seculares?

Os conservadores, bem como os pais fundadores, reconhecem a necessidade de direitos objetivos – direitos derivados não de governos, mas de fatos imutáveis – direitos anteriores à existência de governos, cuja formação se dá, justamente, para protegê-los. Eles reconhecem que a noção esquerdista de que os direitos emanam (provêm) dos governos implica que os governos podem dispor de referidos “direitos” quando e como acharem conveniente (por exemplo, veja Hillary Clinton: “vamos tirar tudo de você em nome do bem comum”). Não há dúvida: para protegê-los dos ataques da esquerda, é precisa defendê-los por meio de uma base sólida.

Contudo, a posição conservadora amplamente defendida de que os direitos provêm de “Deus” não preenche tal requisito, e é por isso que a esquerda está vencendo – como evidenciado (entre outras coisas) pelo aumento da popularidade e do poder de socialistas e pragmáticos.

Embora a noção de que os direitos venham de Deus tenha servido para estabelecer os Estados Unidos, ela não serviu e nem pode servir para manter o que foi conquistado. O fato é que não importa quantas pessoas acreditem nessa noção, não há evidência de tal ser e, muito menos, evidências de que os direitos emanem de Sua vontade.

Desde a fundação dos Estados Unidos, positivistas, utilitaristas e “progressistas” se aproveitam desse fato: já argumentaram que a ideia de “direitos anteriores ao estabelecimento do governo” é “uma besteira sem tamanho” (Jeremy Bentham), e que a ideia de direitos absolutos e inalienáveis ??é “produto da fantasia, como bruxas e unicórnios” (Alasdair MacIntyre). Por quê? Pois, dizem eles, não há evidências para apoiar tais direitos. Consequentemente, professam que os direitos não precedem as leis políticas, mas seguem delas: os governos criam leis; e as leis, por sua vez, ditam os direitos das pessoas que vivem sob esses governos. “Na ausência de um governo”, escreve EJ Dionne, “não há direitos”. Na medida em que os direitos existem, dizem Stephen Holmes e Cass Sunstein, são “concedidos pela comunidade política” e existem apenas na medida em que o sistema legal os protege.

Para defender os direitos inalienáveis ??contra os ataques da esquerda, precisamos de uma concepção de direitos demonstravelmente verdadeira, baseada em evidências. Isso nunca ficou mais claro que é hoje.

Se os conservadores querem proteger esses direitos e, por conseguinte, defender a liberdade, devem reconhecer dois fatos:

  1. Como não há evidências para a existência de Deus, o esforço para defender direitos por referência à ideia de que os direitos provêm de Deus é pior que inútil – é desastroso.
  2. Se existe uma fundação secular, baseada em evidências e demonstravelmente verdadeira para os direitos, os defensores da liberdade precisam entender essa base e utilizá-la em seus esforços para defendê-los – mesmo que, em um nível pessoal, escolham crer que esses advêm de Deus.

Você já viu este comentário nas redes sociais, “queremos fotos, ou não aconteceu”. No que tange a direitos, o fato é: “queremos provas, ou não pode defendê-los”.

Felizmente para os conservadores que realmente querem defender os direitos, a prova de sua existência existe. E embora a prova seja complexa e difícil de se investigar (agradecemos a Ayn Rand por fornecê-la), não é difícil entendê-la.

Para uma compreensão do argumento baseado em evidências para os direitos inalienáveis, considere as conexões fundamentais entre esses direitos e os fatos observáveis.

Os direitos fundamentais que devemos defender caso pretendamos preservar a liberdade e os Estados Unidos são (não coincidentemente) os próprios direitos presentes na fundação da nação:

  • O direito à vida, que é a prerrogativa de tomar todas as ações necessárias para sustentar e promover a própria vida;
  • O direito à liberdade, que é a prerrogativa de ser livre da força física (incluindo a força indireta, como a fraude), de modo que se possa agir de acordo com o próprio julgamento;
  • O direito à propriedade, que é a prerrogativa de manter e usar os produtos de seus esforços;
  • O direito à busca da felicidade, que é a prerrogativa de perseguir os objetivos e os valores de sua própria escolha.

Para apreciar as conexões essenciais entre esses direitos e a realidade perceptiva, é necessário apenas responder a pergunta: por que precisamos desses direitos?

Precisamos deles ou não? Caso não, não temos motivo para preocupação. No entanto, se precisamos deles, entender o motivo disso nos fornecerá os fatos essenciais de sua origem, ancorando-os na realidade, enfim, demonstrando quais fatos os tornam fatos.

Vamos entendê-los, um de cada vez.

Por que precisamos do direito à vida?

Por que precisamos de liberdade para agir como queremos? A resposta é: para viver. Se quisermos viver, devemos agir como a nossa vida exige – e, para fazer isso, devemos ser livres para fazê-lo. Esses são fatos baseados em observação. Nenhuma fé ou crença em Deus é necessária para compreendê-los. Precisamos tão somente olhar para a realidade e pensar.

Se você não agir como a sua vida exige, se você não pensar racionalmente e agir de acordo, em breve, morrerá. Por exemplo, se você não identificar os bens necessários para sustentar sua vida e produzi-los você mesmo, ou produzir algo para negociar com outros produtores para adquiri-los, você não viverá por muito tempo (a menos que você sobreviva parasitariamente dos pensamentos e ações dos outros).

Da mesma forma, se uma pessoa ou um governo o impedem de agir como sua vida exige – por exemplo, se alguém atirar em você, mandá-lo a um campo de concentração ou gastar o dinheiro de sua aposentadoria – você não poderia agir conforme sua vida exige.

Existem, é claro, níveis de força e, portanto, níveis pelos quais sua vida pode ser sufocada pela força. Ser alvo de um tiro na cabeça é um caso extremo que, provavelmente, acabaria com sua vida. Ser jogado num campo de concentração é um nível ligeiramente menor de força, que pode deixá-lo vivo por algum tempo, embora o incapacite de viver uma vida humana. Ter suas economias roubadas é um nível substancialmente menor de força, que pode deixá-lo livre para agir como sua vida exige de muitas outras maneiras, mas que, não obstante, o impede de fazê-lo quando de sua aposentadoria.

Então, embora a força seja imposta em níveis, qualquer nível impede uma pessoa de atuar como sua vida exige. Se, e na medida em que as pessoas ou os governos impedem um indivíduo de agir como a sua vida exige, ele não pode agir como sua vida exige. Nenhuma crença (fé) ou referência a Deus é necessária para entender tal ponto: é um fato observável.

A razão porque precisamos do direito à vida é que é uma exigência factual da vida humana num contexto social. Na medida em que as pessoas ou os governos usam a força contra você, estão impedindo-o de agir como sua vida exige; logo, violam seu direito à vida. Ter uma compreensão firme, lógica e baseada na observação do direito à vida, permite que você saiba e diga àqueles que usam ou tentam usar a força contra você, que estão totalmente errados ao fazê-lo – e que você (ou um agente em seu nome) estão objetivamente justificados a usar qualquer força retaliatória necessária para impedir que opressores violem seu direito à vida.

Agora, um esquerdista (ou qualquer outro irracionalista) pode perguntar: “por que importa se você pode ou não viver?” E a resposta mais breve (se você se dignar a responder) é: porque se você não pode viver, então nada importa. A vida é a condição fundamental para a possibilidade de qualquer coisa importar ou não importar, para a possibilidade de qualquer conceito avaliador – seja “bom” ou “ruim”, “certo” ou “errado”, “deve” ou “não deve”, “importa” ou “não importa”. Essas ideias têm significado apenas em relação à vida.

É por isso que o direito à vida é o direito fundamental, pois é dele que se origina a necessidade de escolhas, ações, valores, princípios ou políticas.

Estes são fatos observáveis por quem escolhe olhar para a realidade e pensar: não é necessário fé ou crença em Deus. E esses fatos e outros relacionados é o que dá origem ao direito à vida: o fato observável que você deve ser livre para tomar todas as medidas necessárias para sustentar e promover sua vida (desde que não viole o mesmo direito de outros).

Por que precisamos do direito à liberdade?

Por que precisamos de liberdade para agir com base em nosso julgamento? A resposta é: porque nosso julgamento racional é o nosso meio básico de sobrevivência.

Embora possamos discordar sobre o que constitui um julgamento racional num caso específico, podemos observar que os seres humanos vivem por meio de seu julgamento racional – isto é, pensando racionalmente e agindo em conformidade.

Por que olhamos para os dois lados antes de atravessar a rua? Porque é racional fazê-lo. Por que não tentamos viver com uma dieta à base de pizza e sorvete, excluindo todos os outros alimentos? Porque seria irracional fazê-lo. Por que procuramos um bom médico em caso de doença? Porque é racional fazê-lo. Por que pensamos em nosso futuro, decidimos o que queremos ser, fazemos planos para alcançar nossos objetivos e agimos de acordo com o nosso julgamento? Porque é racional fazê-lo. Por que ensinamos nossos filhos a pensar antes de agir? Porque sabemos que agir de acordo com o julgamento racional é o meio básico de sobrevivência de alguém. Tais fatos são claros para qualquer um que opte por observar a realidade e pensar.

E assim como podemos observar o fato de que nosso julgamento racional é nosso meio básico de sobrevivência, observamos que, se não somos livres para agir de acordo com nosso julgamento, não podemos viver plenamente como seres humanos.

Se o seu julgamento racional lhe diz que você deve poupar para eventuais problemas de saúde – e se o governo obrigá-lo a depositar esse dinheiro em um fundo de “cuidados médicos” aprovado pela política governamental, então você não pode agir de acordo com seu julgamento. Você não pode depositar seu dinheiro onde pensa que deveria. Você não pode agir de acordo com o seu meio básico de sobrevivência: o julgamento de sua mente. Da mesma forma, se o seu juízo racional lhe disser que você deve negar que a “mudança climática” é um problema, ou que você deve se pronunciar contra a religião assassina do Islã, ou que você deve se casar com seu amante gay ou que deve testar uma droga experimental que pode salvar a sua vida – se o governo proibi-lo de fazê-lo, então você não pode agir de acordo com o julgamento da sua mente.

Como seres humanos, nossa mente é nosso meio básico de sobrevivência. Se somos totalmente livres para agir em nosso julgamento racional, somos livres para viver plenamente como seres humanos. Na medida em que não somos livres para agir em nosso julgamento – na medida em que outras pessoas ou governos nos forçam a agir em contradição com o nosso julgamento – não podemos viver como seres humanos: somos obrigados a viver como propriedade ou servos do Estado.

Uma vida humana é uma vida guiada pelo julgamento da própria mente. É por isso que a escravidão está errada. É por isso que a servidão está errada. É por isso que a violação está errada. E é por isso que é errado o governo forçar as pessoas a agir contra o seu julgamento de qualquer maneira – seja forçando-nos a comprar Obamacare, a nos alistarmos ao exército, a rezar ou a assar um bolo. Forçar as pessoas a agir contra o próprio julgamento é factualmente incorreto e totalmente ilegal, haja vista que as impede de atuar conforme os requisitos de sua vida. Declarado positivamente: as pessoas têm o direito de agir sobre o seu julgamento (desde que não violem os mesmos direitos dos outros) porque agir em seu julgamento é um requisito factual de sua vida como seres humanos.

O direito à liberdade, tal qual o direito à vida, é derivado de fatos observáveis ??com respeito aos requisitos da vida humana. E todos que estão dispostos a olhar para a realidade e a pensar podem ver isso. Nenhuma fé é necessária. Nenhum Deus é necessário. Tudo o que é necessário é a observação e a lógica.

Por que precisamos do direito à propriedade?

Por que precisamos de liberdade para manter e usar os produtos dos nossos esforços? A resposta é: porque os seres humanos sobrevivem transformando as matérias-primas da natureza em bens que podem sustentar e promover a vida humana – consumindo-os de acordo. Se somos totalmente livres para fazê-lo, podemos viver plenamente como seres humanos; na medida em que não somos livres para fazê-lo, não podemos viver como seres humanos.

Para viver, convertemos elementos da natureza em valores para a vida. Por exemplo, tiramos peixes, mirtilos e espargos da natureza, transformando-os em alimentos que sustentam e promovem nossa vida; extraímos árvores, argila e alcatrão da natureza e produzimos madeira, tijolos e telhas; logo, utilizamos esses produtos para construir casas, fábricas e estádios que sustentam e aprimoram nossas vidas; extraímos ferro, alumínio e níquel da natureza, transformando-os em automóveis, aviões e aparelhos de ar condicionado, os quais são alimentados pelo combustível que criamos a partir de petróleo, carvão e gás natural. E assim por diante.

Para viver, devemos transformar as matérias-primas da natureza em bens que podem suportar nossas vidas – e devemos ser livres para consumi-las ou usá-las. Se as pessoas ou os governos impedem que você mantenha ou use os produtos do seu esforço – seja blueberries ou tijolos ou qualquer outra coisa -, então, você não pode usar o produto do seu esforço; assim, você não pode viver plenamente como ser humano.

Aqui, também, existem níveis, e eles importam. Mas a existência de níveis não altera os fatos relevantes – o que, nesse caso, inclui o fato de que impedir a pessoa de manter ou usar o produto de seu esforço é contrário aos requisitos de sua vida como ser humano.

Se você produz alimentos, mas é proibido de comê-lo, você morrerá de fome. Se você produz um abrigo, mas é forçosamente proibido de usá-lo, você morrerá de frio. Se você é dono de uma padaria, mas é forçosamente proibido de geri-la de acordo com seu julgamento, você não morrerá devido a essa coerção, mas você não pode viver plenamente como ser humano, porque você não pode agir completamente sobre o seu meio de sobrevivência: o julgamento da seu mente. Esses são os tipos de fatos e observações que dão origem ao direito à propriedade. E uma vez que esses fatos são enunciados, qualquer pessoa que opte por olhar para a realidade e pensar pode verificá-los. Nem fé, nem Deus são necessários.

Por que precisamos do direito à busca da felicidade?

Por que precisamos de liberdade para atingir os valores e metas que escolhemos? A resposta é: porque o propósito da vida é perseguir os valores e os objetivos que traçamos.

A vida consiste em perseguir os valores que lhe darão sentido. Se não podemos perseguir as coisas que nos farão felizes, não tem sentido viver. Isso é verdade não só para você e para mim, mas para cada indivíduo.

Enquanto a vida é o que dá origem à possibilidade de qualquer coisa que importe ou tenha valor, a busca da felicidade – isto é, a busca do indivíduo por valores que lhe interessam – é o objetivo da vida. É por isso que os Fundadores procuraram proteger o direito à busca da felicidade: perseguir a felicidade é o propósito da vida.

Se você quiser perseguir uma carreira como músico, porque você acha que isso o fará feliz, mas o Estado o obriga, em vez disso, a ser cobrador de impostos porque “isso é melhor para o bem comum”, então você não pode perseguir sua felicidade. Da mesma forma, se uma garota quer perseguir uma educação porque ela vê isso como essencial para sua felicidade, mas o Estado proíbe-a de fazê-lo porque “as mulheres não devem ser educadas”, então, ela não pode perseguir sua felicidade. Da mesma forma, se um homem quer comparecer à igreja, porque sente que isso o fará feliz, mas o estado proíbe-o de fazê-lo porque “isso é contrário aos valores da comunidade”, então ele não consegue perseguir sua felicidade.

Novamente, a existência de níveis não altera os fatos relevantes, que neste caso incluem: precisamos de liberdade para perseguir a felicidade porque precisamos buscar a felicidade para viver uma vida humana plena. E precisamos do direito à busca da felicidade para que possamos saber e dizer àqueles que interferem forçosamente em nossa busca que estão totalmente errados em fazê-lo – e que estamos devidamente justificados a usar a força retaliatória necessária para garantir nossa liberdade.

O que podemos ver por meio dos fatos e exemplos supracitados é que cada um dos principais direitos sobre os quais a América foi fundada é, em última instância, fundamentado em fatos percebíveis na realidade. As razões pelas quais precisamos desses direitos são os próprios fatos que dão origem e apoiam esses direitos. E todos que estão dispostos a olhar para a realidade e pensar podem ver isso.

Claro, algumas pessoas não estão dispostas a olhar para a realidade e pensar. Eles incluem esquerdistas, “progressistas”, jihadistas e teóricos. Mas todos os que se preocupam genuinamente com a liberdade e estão dispostos a olhar para a realidade e pensam que os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à busca da felicidade são baseados em fatos, ou seja, os requisitos factuais da vida humana em um contexto social.

Se os conservadores querem manter a crença em Deus – e mesmo que eles desejem manter a crença de que os direitos de alguma forma vêm de Deus – essa é sua prerrogativa. Mas se os conservadores querem defender com sucesso os direitos e, assim, defender a liberdade e a América, eles devem reconhecer que um argumento livre de evidências para os direitos é problematicamente inferior a um argumento baseado em evidências. Eles devem reconhecer e abraçar o fato de que existe uma base sólida baseada em evidências para esses direitos tão valiosos, e que é essencial para a proteção dos direitos.

Frente ao exposto, não há motivo para um verdadeiro defensor da liberdade não abraçar os fundamentos seculares dos direitos. E há um mundo inteiro de razões para todos os defensores da liberdade abraçá-los.

Uma base/fundação secular dos direitos é a única coisa que pode unificar e fortalecer o direito contra a esquerda. Todo mundo à direita que se preocupa em defender nossos direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à busca da felicidade deve reconhecer esse fato e agir em conformidade. Falhar ao fazê-lo é renunciar a uma reivindicação de estar à direita.

__________________________________________

Publicado originalmente em The Objective Standard.

Traduzido por Josiberto Benigno.

Revisado por Matheus Pacini.

Curta a nossa página no Facebook.

Inscreva-se em nosso canal no YouTube.

__________________________________________

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Inscreva-se na nossa Newsletter