BioShock viola as premissas básicas do Objetivismo.

O jogo BioShock foi lançado em 2007 pela 2K Games. O principal antagonista é Andrew Ryan, um “magnata dos negócios” que funda uma cidade submarina chamada Rapture. Supostamente, ele segue o Objetivismo, filosofia que Ayn Rand propôs e defendeu em seus romances e livros de não ficção.

Como a versão remasterizada da série BioShock foi lançada recentemente, decidi tirar um tempo para comentá-lo à luz do Objetivismo.

Minha opinião é a de que BioShock deturpa o Objetivismo. Logo no início, vemos a atitude de Andrew Ryan com respeito à moralidade. No discurso introdutório do jogo, ele diz:

Eu criei… Rapture. Uma cidade onde o artista não temeria o censor; onde o cientista não seria limitado por fútil moralidade; onde o grande não seria restringido pelo pequeno!

Aqui, Ryan descarta a moralidade como fútil e insignificante, em claro contraste à Ayn Rand, que considerava a moralidade de suma importância, tanto que ela é parte central da filosofia objetivista. Qualquer pessoa que se considera objetivista também leva a moralidade muito a sério, pois é um guia extremamente importante para a vida. O Objetivismo apresenta um código integral de valores e virtudes que, se seguido, pode ajudar as pessoas a alcançar uma vida boa e a felicidade genuína.

Em BioShock, ADAM é uma droga não testada e, potencialmente, perigosa. Logo, de acordo com o Objetivismo, os splicers de Rapture são imorais ao desconsiderar as consequências de longo prazo de suas ações ao se injetar ADAM. Eles não estavam sendo egoístas racionais como Ayn Rand defendia, mas “adoradores de caprichos” autodestrutivos, em sua terminologia. Ayn Rand pensava que as pessoas deveriam perseguir sua felicidade de longo prazo através de pensamento cuidadoso, planejamento e esforço dedicados. O povo de Rapture não tinha boa razão para arriscar sua saúde e segurança de longo prazo em prol de poderes físicos ou melhorias cosméticas. Nesse sentido, o estado caótico de Rapture é resultado de comportamento antiobjetivista.

Politicamente, o Objetivismo defende uma república capitalista laissez-faire, muito próxima ao que os Estados Unidos foi em seu fundação. Ayn Rand acreditava que o governo deveria ser responsável pela polícia, exército e sistemas de justiça (tribunais). A legislatura e outros grandes oficiais de governo deveriam ser eleitos por voto popular.

O papel do governo é assegurar que os direitos individuais dos residentes do país sejam imparcialmente protegidos – isto é, a vida, a liberdade e a propriedade de todos devem ser igualmente protegidas de criminosos, de agressores externos e da arrogância dos oficiais de governo. Isso significa que o governo precisa ter salvaguarda institucional contra o abuso de poder e a corrupção, ou seja, separação de poderes, eleições e uma constituição escrita.

A Rapture de Andrew Ryan não tem nada disso. Ryan é, de fato, um ditador que poderia promulgar leis ao seu bel-prazer. Essa é uma forma de governo totalmente contrária ao Objetivismo.

Ryan usa seu poder para acabar com o comércio com o mundo exterior. Em regra geral, essa é uma medida contrária ao Objetivismo. Objetivismo é pró-livre mercado nas esferas doméstica e internacional.

Em minha interpretação, existem só duas circunstâncias em que o governo teria justificativa para restringir o comércio internacional. A primeira é no caso de uma guerra declarada com outro país. Nesse caso, o governo estaria justificado em cortar laços comerciais com esse, estritamente, pela duração da guerra.

O segundo caso seria se um país estrangeiro Y tivesse efetivamente nacionalizando algumas de suas empresas, apresentando uma ameaça clara bona fide aos cidadãos do país. Nesse caso, o governo X poderia banir o comércio com empresas que têm associações próximas com Y. Tal comércio constituiria ajuda direta aos criminosos que cometem violações claras aos direitos humanos, bem como ameaçam as pessoas com o respaldo governamental.

Para ser legítimo, ambas as restrições teriam de ser promulgadas por um governo adequado, propriamente eleito, e não pelo capricho de um ditador. O sentimento de Andrew Ryan de que Rapture é um alvo tentador para invasores não é nem de perto suficiente como justificativa.

Assim, existem quatro pontos pelos quais afirmo que Andrew Ryan e Rapture deturparam a filosofia objetivista de Ayn Rand:

  • Ryan essencialmente descarta a moralidade, em claro contraste ao que Ayn Rand defendia.
  • Os cidadãos de Rapture desconsideram a moralidade, bem como seus próprios interesses de longo prazo ao se injetaram drogas não testadas e perigosas.
  • Andrew Ryan administra Rapture como uma ditadura, em contraste ao que defende o Objetivismo na política.
  • Como ditador, Andrew Ryan corta laços comerciais de Rapture com o mundo externo. Ele, assim, comete uma iniciação de força imoral contra inocentes.

Se os cidadãos de Rapture tivessem sido, em grande parte, morais no sentido objetivista do termo, teria havido pouca ou nenhuma demanda por ADAM. Sem a restrição arbitrária do comércio promulgada por Ryan, Frank Fontaine não teria prosperado como contrabandista. Se Rapture tivesse tido um governo capitalista laissez-faire, a atividade criminal de gangsteres e splicers teria sido neutralizada antes de sair do controle. O que torna o declínio de Rapture possível não é o Objetivismo, mas comportamentos e políticas que violam o Objetivismo em suas premissas fundamentais.

A intenção dos desenvolvedores de BioShock é mostrar o que acontece com uma sociedade que abraça totalmente a filosofia de Ayn Rand. Mas eles não entenderam o Objetivismo suficientemente bem para representá-lo de forma precisa. Sua descrição é uma caricatura de mau gosto que tem pouquíssima semelhança com o que Rand, de fato, defendeu.

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Revisão de Matheus Pacini

Publicado originalmente em Objectivism in Depth

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