‘A Revolta de Atlas’ e a importância de um propósito na vida

***Esse é um trecho da entrevista de Ayn Rand à revista Playboy. Ela está disponível na íntegra aqui***

PLAYBOY: Miss Rand, seus romances e ensaios e, em especial, seu controvertido best-seller, A Revolta de Atlas, apresenta uma visão de mundo cuidadosamente projetada e intrinsecamente consistente. Na verdade, ele é a expressão de um sistema filosófico abrangente. O que você procura alcançar com esta nova filosofia?

RAND: Eu busco oferecer aos homens – ou a aqueles que gostam de pensar – uma visão integrada, coerente e racional da vida.

PLAYBOY: Quais são as premissas básicas do Objetivismo? Qual o ponto de início?

RAND: Começa com o axioma de que a existência existe, o que significa que uma realidade objetiva existe independentemente de qualquer observador ou das emoções, sentimentos, desejos, esperanças e medos do perceptor. O Objetivismo sustenta que a razão é a único meio pelo qual o homem percebe a realidade, e é seu único guia para a ação. Por razão, eu quero dizer a faculdade que identifica e integra o material fornecido pelos sentidos do homem.

PLAYBOY: Em A Revolta de Atlas, o seu herói, John Galt, declara: “Eu juro – por minha vida e meu amor por ela – que eu nunca vou viver em função de outro homem, nem pedir a outro homem que viva em função de mim.” Como isso está relacionado a seus princípios básicos?

RAND: A declaração de Galt é um sumário dramatizado da ética objetivista. Qualquer sistema de ética é baseado e deriva, implícita ou explicitamente, da metafísica. A ética derivada da base metafísica do Objetivismo afirma que, como a razão é a ferramenta básica do homem para sua sobrevivência, a racionalidade é a sua maior virtude. Usar sua mente, perceber a realidade e agir de acordo, é o imperativo moral do homem. O padrão de valor da ética objetivista é a vida do homem – a sobrevivência do homem enquanto homem – ou o que a natureza de um ser racional requer, para sua própria sobrevivência. A ética objetivista, em essência, sustenta que o homem existe para seu próprio bem, que a busca de sua própria felicidade é o seu maior propósito moral, que não deve se sacrificar para os outros, nem sacrificar os outros para si mesmo. Em suma, é isso que a declaração de Galt resume.

PLAYBOY: Que tipo de moralidade deriva desta, em termos de comportamento do indivíduo?

RAND: Este é apresentado em detalhes em A Revolta de Atlas.

PLAYBOY: A heroína de A Revolta de Atlas foi, em suas palavras, “completamente incapaz de experimentar um sentimento de culpa fundamental.” É possível qualquer sistema de moralidade sem culpa?

RAND: A palavra importante na passagem que você citou é “fundamental”. Culpa fundamental não significa a capacidade de se julgar suas próprias ações e lamentar uma ação errada, se alguém a cometer. Culpa fundamental significa que o homem é mau e culpado por natureza.

PLAYBOY: Você se refere ao pecado original?

RAND: Exatamente. É o conceito de pecado original que minha heroína, ou eu, ou qualquer objetivista, é incapaz de aceitar ou experimentar emocionalmente. É o conceito de pecado original que nega a moralidade. Se o homem é culpado por natureza, ele não tem escolha quanto a isso. Se ele não tem escolha, a questão não pertence ao campo da moralidade. Moralidade pertence apenas à esfera de livre-arbítrio do homem – apenas para aquelas ações que estão abertas à sua escolha. Considerar o homem culpado por natureza, é uma contradição em termos. Minha heroína seria capaz de sentir culpa por uma ação específica. Só que, sendo uma mulher de elevada estatura moral e autoestima, ela zelaria para não fazer nada que lhe atribuísse qualquer culpa por seus atos. Ela agiria de uma forma totalmente moral e, portanto, não aceitaria uma culpa imerecida.

PLAYBOY: Em A Revolta de Atlas, um de seus personagens principais é questionado, “qual é o tipo mais depravado de ser humano?” Sua resposta é surpreendente: ele não diz um sádico ou um assassino ou um maníaco sexual ou um ditador, ele diz: “o homem sem um propósito.” No entanto, a maioria das pessoas parece passar sua vida sem um propósito claramente definido. Você as considera depravadas?

RAND: Sim, até um certo ponto.

PLAYBOY: Por quê?

RAND: Porque esse aspecto de seu caráter está na raiz e causa de todos os males que você mencionou em sua pergunta. Sadismo, ditadura, qualquer forma de mal, é a consequência da evasão de um homem da realidade. Uma consequência de sua incapacidade de pensar. O homem sem propósito é um homem que flutua à mercê de sentimentos aleatórios ou não identificados, insta e é capaz de qualquer mal, porque ele está totalmente fora do controle de sua própria vida. A fim de estar no controle de sua vida, você tem que ter um propósito – um propósito produtivo.

PLAYBOY: Não estavam Hitler e Stálin, para citar dois tiranos, no controle de suas próprias vidas, e não tinham eles um propósito claro?

RAND: Certamente, não. Observe que ambos terminam como psicóticos literais. Eles eram homens que não tinham autoestima e, portanto, odiavam toda a existência. Sua psicologia, na verdade, está resumida em A Revolta de Atlas pela personagem James Taggart. O homem que não tem fim, mas tem de agir, age para destruir os outros. Isso não é a mesma coisa que um propósito produtivo ou criativo.

PLAYBOY: Se uma pessoa organiza a sua vida em torno de um propósito único, perfeitamente definido, não está em perigo de se tornar extremamente estreita em seus horizontes?

RAND: Muito pelo contrário. Um propósito central serve para integrar todos as outras preocupações da vida de um homem. Ele estabelece a hierarquia, a importância relativa, de seus valores, ele o salva de inúteis conflitos interiores, permitindo-lhe aproveitar a vida em grande escala, e realizar essa apreciação em qualquer área aberta à sua mente, ao passo que um homem sem propósito se perde no caos. Ele não sabe quais são os seus valores. Ele não sabe como julgar. Ele não pode dizer o que é ou não é importante para ele, e, portanto, ele deriva impotente, à mercê de qualquer estímulo casual ou capricho do momento. Ele nada pode desfrutar. Ele passa a vida à procura de algum valor que ele nunca encontrará.

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Tradução de Roberto Rachewsky

Revisão de Matheus Pacini

Publicado originalmente por Playboy

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